O Antigo Testamento, também chamado de Velho Testamento, é a porção da Bíblia que registra a história da redenção no período anterior ao advento de Cristo. Isso, inclusive, explica a designação “Antigo Testamento”. A palavra “testamento”, do latim testamentum, traduz a palavra grega diatheke, que indica uma aliança, um pacto ou um contrato.
Muitos eruditos concordam que a palavra “testamento” não é a melhor tradução do termo grego; já que a designação “Antigo Testamento” faz referência à antiga aliança firmada por Deus com o povo de Israel, indicando que seu conteúdo registra os principais acontecimentos da história desse antigo pacto.
Talvez “Antigo Pacto” fosse uma designação mais apropriada. Inclusive, o Novo Testamento se refere à Escritura do Antigo Testamento como a leitura da “Antiga Aliança” (2 Coríntios 3:14). Mas essa designação, “Antigo Testamento”, acabou se tornando comum entre os cristãos a partir do segundo século depois de Cristo.
Seja como for, fica claro que a Bíblia cristã é dividida em duas grandes partes, isto é, em duas grandes alianças. O Antigo Testamento é a primeira dessas duas divisões; enquanto que o Novo Testamento é a segunda.
Também é importante saber que quando Deus criou o homem, a escrita não passou a existir imediatamente. Na verdade, houve um longo caminho até que as primeiras formas de escritas fossem desenvolvidas. Isso significa que parte da história do Antigo Testamento ocorreu num tempo em que não havia a escrita.
Então durante esse tempo, as histórias da revelação de Deus foram sendo transmitidas por tradição oral. Mas o próprio Deus esteve diretamente envolvido nesse processo, de modo a preservar sua revelação para que mais tarde ela fosse registrada de forma infalível pelas pessoas que foram escolhidas por Ele para produzirem a Escritura.
Como e quando o Antigo Testamento foi escrito?
O Antigo Testamento foi escrito num período de aproximadamente mil anos, entre meados do segundo milênio e meados do primeiro milênio antes de Cristo. O primeiro livro provavelmente foi escrito em cerca de 1440 a.C., no tempo do êxodo dos israelitas do Egito. Já o último livro do Antigo Testamento foi escrito por volta 430 a.C., depois do período do cativeiro dos judeus na Babilônia.
Os textos do Antigo Testamento, em sua ampla maioria, foram escritos em hebraico antigo. Algumas pequenas porções do Antigo Testamento também foram escritas em aramaico — outro idioma que também não é mais falado. Os trechos em aramaico estão nos livros de Daniel, Esdras e Jeremias. Pequenas tábuas, pedras, louças, couro e pele de animal eram os materiais mais usados para a escrita naquele tempo.
A forma como o Antigo Testamento foi escrito também chama a atenção das pessoas. Embora o antigo Testamento seja uma coleção de livros antigos, ele também é a Escritura Sagrada, ou seja, a Palavra de Deus. Isso significa que o próprio Deus esteve envolvido em sua composição, de modo que cada palavra foi inspirada por Ele (cf. 2 Timóteo 3:16).
Mas isso não significa que os escritos do Antigo Testamento foram ditados por Deus. O processo de inspiração da Escritura foi muito mais complexo. Apesar de cada palavra contar com a inspiração divina, o processo de composição das Escrituras não anulou a personalidade, as características e o trabalho de pesquisa de dezenas de escritores humanos.
Então os textos do Antigo Testamento registram a revelação de divina que foi dada progressivamente ao homem por obras poderosas de Deus e por palavras proféticas; bem como as reações humanas a essa revelação.
Isso quer dizer que no processo de registro do Antigo Testamento, algumas vezes os escritores bíblicos interpretaram os atos poderosos de Deus ao longo da história dando-lhes o significado correto, e nesse processo eles fizeram uso, inclusive, de tradições orais e escritos mais antigos. Outras vezes, os escritores bíblicos registraram de forma direta as palavras proféticas da parte de Deus ao seu povo.
A organização do Antigo Testamento
O Antigo Testamento possui trinta e nove livros que estão organizados em diferentes categorias:
- Livros da Lei (Pentateuco): Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio.
- Livros Históricos: Josué, Juízes, Rute, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis, 1 e 2 Crônicas, Esdras, Neemias e Ester.
- Livros Poéticos: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cânticos dos Cânticos de Salomão.
- Livros Proféticos: Isaías, Jeremias, Lamentações, Ezequiel, Daniel, Oseias, Joel, Amós, Obadias, Jonas, Miqueias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias. Essa categoria geralmente é subdividida em cinco profetas maiores (de Isaías a Daniel) e doze profetas menores (de Obadias a Malaquias).
Esses trinta e nove livros são os mesmos encontrados no Cânon hebraico. Mas na Bíblia hebraica esses escritos possuem uma organização diferente, e se concentram em três categorias principais:
- A Lei: os cinco livros de Moisés (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio).
- Os Profetas: essa categoria possui duas subdivisões, os Primeiros Profetas (Josué, Juízes, Samuel e Reis) e os Profetas Posteriores (Isaías, Jeremias, Ezequiel e os Doze Profetas Menores).
- Os Escritos: essa categoria também é composta por três subdivisões. A primeira subdivisão compreende os Livros Poéticos (Salmos, Provérbios, Jó). A segunda subdivisão é chamada de Cinco Rolos (Cânticos dos Cânticos, Rute, Lamentações, Eclesiastes e Ester). Por fim, a terceira subdivisão é formada pelos Livros Históricos (Daniel, Esdras-Neemias e Crônicas).
A contagem de livros do Cânon hebraico geralmente resulta num total de 24 livros — pelo menos na contagem mais comum. Isso não quer dizer que a Bíblia hebraica contém menos livros que o Antigo Testamento da Bíblia cristã. O conteúdo é exatamente o mesmo, a diferença no número de livros ocorre simplesmente pela forma como eles estão organizados.
Por exemplo: os livros dos doze profetas menores são considerados apenas um único livro na Bíblia hebraica; assim como os livros de Esdras e Neemias. Além disso, alguns livros não são divididos em dois volumes como no Antigo Testamento da Bíblia cristã (Samuel, Reis e Crônicas). A organização do Antigo Testamento presente na Bíblia cristã deriva da Septuaginta, que é a tradução grega da Bíblia hebraica.
A formação do Cânon do Antigo Testamento
A lista de livros do Antigo Testamento muitas vezes leva ao seguinte questionamento: Como foi decidido que um determinado livro devia ser reconhecido como Palavra de Deus? A resposta diz respeito à formação do Cânon do Antigo Testamento.
Primeiro, a palavra “cânon” deriva de uma palavra grega que basicamente indica uma vara reta de medir, ou seja, de forma simples podemos dizer que o “cânon” é uma régua. Com o tempo, essa palavra passou a ser aplicada para indicar a relação de livros considerados sagrados por terem sido inspirados por Deus e que, portanto, regulamentam a fé e a conduta cristã.
Não é nada fácil estudar a formação do Cânon do Antigo Testamento, porque isso aconteceu há muito tempo. Mas de forma resumida, parece que quando finalmente os livros do Antigo Testamento começaram a ser escritos, esses livros foram sendo naturalmente recebidos pela comunidade da aliança como a genuína Palavra de Deus.
Então antes mesmo de o Cânon do Antigo Testamento ser fechado, os livros que já tinham sido escritos anteriormente já eram considerados sagrados pelos israelitas. Por exemplo: no tempo dos juízes de Israel, a Escritura do Pentateuco já era recebida como a Palavra de Deus; bem como no tempo dos profetas os escritos anteriores também já eram aceitos.
Isso indica que os livros do Cânon do Antigo Testamento sempre possuíram um caráter auto identificador. Da mesma forma como o Espírito Santo inspirou a Escritura, Ele também operou nos corações do povo de Deus para que a Escritura fosse reconhecida como a autoridade legitima sob a qual os crentes devem se submeter.
Então ao longo do tempo, os escritos individuais foram sendo agrupados numa coleção. Mas apesar de posteriormente alguns concílios terem sido organizados como o objetivo de tratar da questão da canonicidade dos escritos do Antigo Testamento, a verdade é que a fixação do Cânon como conhecemos hoje não resulta da vontade humana, mas da providência de Deus. Providencialmente, Deus agiu através das ações humanas em todo o processo da formação do Cânon, desde sua origem até sua preservação e aceitação pela comunidade judaica.
O Antigo Testamento para a Igreja Cristã
A Igreja Cristã acompanhou o entendimento da comunidade judaica na recepção do Antigo Testamento como a Palavra de Deus genuína. Nos dias do Novo Testamento, a coleção de livros do Antigo Testamento já estava completa. Inclusive, o Antigo Testamento era a Bíblia usada por Jesus e pelos apóstolos.
O fato de frequentemente o Novo Testamento se referir aos escritos do Antigo Testamento como “as Escrituras”, significa que naquele tempo o Cânon do Antigo Testamento já existia como uma coleção fechada (cf. Mateus 26:54; João 5:39; Atos 17:2; etc.).
O próprio Senhor Jesus Cristo deixou claro que os livros do Antigo Testamento testificavam dele (Lucas 24:44). Apenas no Evangelho de Mateus, há pelo menos trinta e uma citações diretas do Antigo Testamento nos ensinos de Jesus.
Numa dessas citações, Jesus fez referência às mortes de Abel e de Zacarias (Mateus 23:35). A morte de Abel está registrada em Gênesis 4, e a morte do Zacarias citado por Jesus está registrada em 2 Crônicas 24:22. Isso é interessante porque na organização da Bíblia hebraica, Gênesis é o primeiro livro, enquanto que Crônicas é o último livro. Essa parece ser uma boa indicação de que nos dias de Jesus o Antigo Testamento já era visto como uma coleção completa que se encerrava no livro de Crônicas.
A Igreja Primitiva igualmente aceitou o Antigo Testamento como canônico. Em suas epístolas endereçadas a diversas comunidades cristãs daquela época, os apóstolos fizeram muitas citações do Antigo Testamento. Inclusive, o apóstolo Pedro escreveu especificamente sobre a inspiração da Escritura do Antigo Testamento (2 Pedro 1:20,21).
Mas no tempo do Novo Testamento o idioma mais comum era o grego. Então geralmente os cristãos primitivos usavam a Septuaginta, que era a tradução grega do Antigo Testamento realizada no período intertestamentário.
Um fato importante é que a Septuaginta trouxe também alguns livros adicionais com alguma importância religiosa e histórica. Mas esses livros jamais foram reconhecidos como canônicos pela comunidade judaica e pela Igreja Cristã dos primeiros séculos. Porém, depois da Reforma Protestante, a tradição católica reconheceu a canonicidade desses livros, incluindo-os em sua coleção do Antigo Testamento.
Contexto e geografia do Antigo Testamento
O Antigo Testamento registra uma história que vai desde o início dos tempos até o período do pós-exílio, quando o povo judeu reconstruiu a cidade de Jerusalém que havia sido destruída pelos babilônios. Obviamente isso significa que há uma riqueza de detalhes muito grande nos relatos do Antigo Testamento.
De forma especifica, o pano de fundo dos acontecimentos do Antigo Testamento foi o Antigo Oriente Próximo. As histórias veterotestamentárias ocorreram nas regiões da Mesopotâmia, Siro-Fenícia, Egito, Península Arábica, Palestina e Península Anatoliana.
Portanto, devido a toda essa abrangência, os livros do Antigo Testamento foram escritos nos mais diversos contextos, como: migrações, guerras, derrotas, vitórias, cativeiros, libertações, restaurações etc.
É por isso que muitos personagens, acontecimentos históricos, reinos e impérios são citados no Antigo Testamento. Mas diferentemente das literaturas mitológicas das culturas pagãs, o Antigo Testamento jamais se propôs a esconder a imperfeição de seus personagens. Isso acaba revelando um cenário dramático que expressava a necessidade de um Redentor para a humanidade.
A mensagem do Antigo Testamento
Os primeiros cinco livros do Antigo Testamento relatam a história da criação do mundo e a formação do povo de Israel. Esses livros mostram que a família de Abraão foi escolhida por Deus, e através dela a nação de Israel foi formada.
Essa nação cresceu durante o tempo em que esteve no Egito, de onde foi poderosamente libertada por Deus. Depois, Deus guiou essa nação pelo deserto rumo à terra prometida. Durante esse tempo a Lei foi dada, regulamentando a vida civil e religiosa da comunidade da aliança.
Os livros históricos registram os acontecimentos que ocorreram desde à chegada dos israelitas à Terra Prometida até o período pós-exílio. Esse foi um espaço de tempo de quase mil anos. Nesse período, primeiro o povo de Israel foi organizado em confederações no tempo dos juízes, e depois foi unido numa monarquia. Mas após o reinado do rei Salomão, o reino unificado de Israel foi dividido em dois reinos: Reino do Norte (Israel) e Reino do Sul (Judá).
Por causa do pecado, ambos os reinos foram conquistados por nações estrangeiras. Primeiro, o Reino do Norte foi conquistado pelo Império Assírio, e depois o Reino do Sul foi conquistado pelo Império Babilônico. Já os livros proféticos registram os oráculos de Deus através dos profetas durante todo esse período.
Por fim, os livros poéticos foram escritos ao longo desse período. O livro de Jó conta a história de um homem que provavelmente viveu no período patriarcal. O livro de Salmos traz uma coleção de cânticos desde o tempo de Moisés até o tempo da monarquia, quando também foram escritos os demais livros poéticos.
Mas de forma geral, a grande mensagem do Antigo Testamento é a história da redenção que continua também no Novo Testamento. Na verdade, o Antigo Testamento prepara e anuncia o que é revelado e cumprido no Novo Testamento. Nesse sentido, o Antigo Testamento mostra como Deus escolheu para si um povo através do qual seu Filho haveria de vir ao mundo. A mensagem do Antigo Testamento revela a forma como Deus preparou todas as coisas para que o seu propósito redentor fosse cumprido.
A importância do Antigo Testamento
O Antigo Testamento é Escritura Sagrada e, portanto, indispensável a todo cristão. O apóstolo Paulo escreve que “Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça; a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra” (2 Timóteo 3:16,17). Então ninguém tem permissão para descartar qualquer parte da Escritura dada por Deus.
Além disso, o escritor de Hebreus explica que “havendo Deus antigamente falado muitas vezes, e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, a nós falou-nos nestes últimos dias pelo Filho” (Hebreus 1:1). Isso mostra o caráter preparatório do Antigo Testamento. Jamais poderíamos entender o Novo Testamento e reconhecer a importância da obra de Cristo, sem o Antigo Testamento.
Portanto, o Antigo Testamento é um testemunho claro das ações soberanas de Deus na história, e uma prova nítida da identidade de Cristo. É absolutamente impossível pensar no conceito de salvação pela graça mediante a fé, se o Antigo Testamento não for recebido como Palavra de Deus (cf. Romanos 3:21; 2 Timóteo 3:15).
Embora os crentes estejam agora sob uma nova aliança em Cristo, a mensagem do Antigo Testamento não foi invalidada. Essa mensagem continua revelando a verdade de Deus ao mundo e o seu propósito de salvação para o louvor de sua glória. Por fim, o próprio Cristo fez uso da Escritura do Antigo Testamento. Então se essa Escritura foi importante para Cristo, certamente ela também é indispensável para nós.