Biblicamente até é possível falar de cobertura espiritual, mas não do jeito que a maioria das pessoas pensa. A visão bíblica do que se pode chamar de “cobertura espiritual” diz respeito unicamente ao cuidado de Deus com Seu povo.
Mas o conceito mais difundido na atualidade sobre cobertura espiritual é aquele que mistura interpretações equivocadas sobre a importância da intercessão e o ministério de liderança cristã. Então esse conceito enxerga a cobertura espiritual como sendo a ação protetora de alguns líderes que supostamente são capazes de proteger espiritualmente seus liderados através da intercessão e da autoridade espiritual que exercem.
O que cobertura espiritual não é?
Definitivamente não há base bíblica para defender a ideia de que determinadas pessoas desfrutam de um nível superior de comunhão com Deus que lhes conferem autoridade e capacidade de prover cobertura espiritual aos seus liderados. Mas é exatamente isso que os adeptos da cobertura espiritual advogam.
Eles dizem possuir um tipo de poder restrito aos demais, e ter acesso a um conhecimento que outros não possuem. Então eles são capazes de proteger, guiar, decidir e até dominar sobre a vida daqueles que estão debaixo de sua cobertura espiritual. Por isso suas orações são vistas como mais poderosas e suas palavras como imbuídas de autoridade para “liberar” provisão, prosperidade e proteção aos que estão sob sua cobertura espiritual.
Mas além de esse tipo de entendimento ser completamente antibíblico, ele não passa de uma mistura que reúne antigas crendices pagãs, conceitos gnósticos e misticismo moderno. Eram os pagãos da antiguidade que acreditavam que viviam debaixo de um tipo de “cobertura espiritual” em suas terras.
No paganismo antigo, cada cidade tinha sua divindade. A crença popular dizia que os cidadãos estariam protegidos enquanto estivessem sob os limites do território sob o qual determinada divindade legislava. Mais tarde, a heresia do gnosticismo trouxe, entre outras coisas, a ideia de um conhecimento superior acerca dos mistérios divinos que nem todos possuem. Então muitos líderes evangélicos combinaram fragmentos desses conceitos na concepção de um tipo de poder místico que chamam de “cobertura espiritual”.
O que é a cobertura espiritual na Bíblia?
A expressão “cobertura espiritual” não existe na Bíblia. Mas como foi dito, até podemos chamar de cobertura espiritual a ação protetora de Deus ao seu povo. O próprio Senhor Jesus encorajou seus seguidores a clamar por essa cobertura em suas orações. Na oração do Pai Nosso os crentes são ensinados a pedir: “não nos deixe cair em tentação, mas livra-nos do mal” (Mateus 6:13).
Depois, Jesus ainda tratou de esclarecer que essa genuína cobertura espiritual da parte de Deus é sempre eficaz. Ele diz: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem. Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, e ninguém as arrebatará da minha mão. Aquilo que meu Pai me deu é maior do que tudo; e da mão do Pai ninguém pode arrebatar” (João 10:27-29).
Os apóstolos entenderam essa doutrina bíblica e também falaram da cobertura espiritual do Senhor. O apóstolo Paulo escreve aos crentes de Corinto e de Tessalônica dizendo que Deus é quem matem o Seu povo firme até o fim; Ele é quem protege o cristão do Maligno (1 Coríntios 1:9). Aos crentes de Colossos, o mesmo apóstolo diz que a vida do redimido está escondida com Cristo em Deus (Colossenses 3:3). Isto sim é que é cobertura espiritual!
O apóstolo Pedro igualmente conforta os crentes sobre a realidade da cobertura espiritual de Deus. Ele diz que mediante a fé estamos guardados na virtude de Deus para a salvação, e que podemos lançar sobre Ele toda a nossa ansiedade, porque Ele cuida de nós (1 Pedro 1:5; 5:7).
Não confunda liderança, intercessão e cobertura espiritual
É verdade que Deus designa pessoas para servirem como pastores fiéis de seu rebanho. Essas pessoas devem ser respeitadas pelo ofício que receberam. Elas não apenas intercedem por todo povo do Senhor, como também se preocupam com a saúde espiritual da comunidade cristã através do ensino, exposição e aplicação das Escrituras (Hebreus 13:17).
Mas essas pessoas não possuem poder de prover cobertura espiritual a ninguém; e suas orações não são mais poderosas que as orações dos demais crentes. Inclusive, os líderes cristãos também precisam ser alvo das orações de toda Igreja (Hebreus 13:18). O próprio apóstolo Paulo, por exemplo, frequentemente rogava pelas orações dos crentes (Romanos 15:31,32; 2 Tessalonicenses 3:1).
A Bíblia diz enfaticamente que devemos orar uns pelos outros (Efésios 6:18; Tiago 5:16). O exercício da intercessão deve caracterizar a vida cristã; mas jamais deve ser confundido com um tipo de prática mística de cobertura espiritual.
Além disso, podemos dizer que é por causa da “cobertura espiritual” de Cristo que todos os crentes possuem o privilégio de se achegar com confiança ao trono da graça e encontrar misericórdia e socorro (Hebreus 4:16).
Quando oramos, não estamos cobrindo espiritualmente as pessoas como se estivéssemos estendendo sobre elas um tipo de cobertura mística; mas estamos clamando por Aquele que é o único que nos cobre de misericórdia, graça, amor, proteção e provisão. Então Ele responde as nossas orações de acordo com seu propósito eterno e soberano.