Gênesis 38 registra a terrível história envolvendo Judá e Tamar. O estudo bíblico de Gênesis 38 mostra como a família da aliança começou a se corromper em Canaã através do casamento misto de Judá. Mas no final, um capítulo que registra tanta maldade e imoralidade também aponta para a graça e a providencia de Deus.
O capítulo 38 de Gênesis é um interlúdio na narrativa da história de José que havia sido vendido como escravo no Egito (Gênesis 37). Mas não se trata de um desvio anacrônico da história. O escritor bíblico deixa claro que os eventos narrados em Gênesis 38 se deram naquela mesma época (Gênesis 38:1).
Isso significa que o episódio de Judá e Tamar foi contemporâneo ao tempo da escravidão de José no Egito. Além do mais, esse parêntesis na história de José serve como um contraste entre a piedade do irmão que estava sendo escravo no Egito e a imoralidade do outro irmão que estava livre em Canaã.
O esboço de Gênesis 38 pode ser organizado da seguinte forma:
- O casamento de Judá (Gênesis 38:1-5).
- A história dos filhos de Judá (Gênesis 38:6-11).
- O plano de Tamar (Gênesis 38:12-23).
- A revelação do pecado de Judá (Gênesis 38:24-30).
O casamento de Judá (Gênesis 38:1-5)
Gênesis 38 começa relatando a fragmentação da família da aliança. Judá se apartou de seus irmãos e se hospedou na casa de um homem de Adulão, uma cidade cananéia que ficava a pouco mais de um quilometro a noroeste de Hebrom (Gênesis 38:1).
Naquele lugar Judá conheceu uma mulher que era filha de um homem cananeu, Sua. Judá tomou a filha de Sua por mulher e teve filhos com ela (Gênesis 38:2-5,12). Isso quer dizer que Judá não apenas se separou geograficamente de seus irmãos, mas se integrou aos cananeus casando com uma de suas mulheres.
O Antigo Testamento frequentemente mostra como a mistura com outros povos sempre foi uma ameaça à identidade distintiva do povo da aliança. Aqui em Gênesis 38 é uma dessas vezes em que os descendentes de Abraão estiveram próximos de serem assimilados por um povo pagão. Contudo, José já havia sido enviado ao Egito – local para onde mais tarde todos os seus irmãos também seriam levados.
Nesse ponto podemos enxergar a providencia de Deus. Se por um lado o Egito foi a terra onde os israelitas foram segregados depois da morte de José, por outro lado também foi a terra em que Deus preservou a identidade de seu povo levantando-o como uma grande nação.
A história dos filhos de Judá (Gênesis 38:6-11)
O texto bíblico diz que Judá providenciou uma esposa para Er, seu filho mais velho. O nome dessa esposa era Tamar. Mas Er foi um homem perverso perante o Senhor e acabou sendo castigado com a morte pela justiça divina (Gênesis 38:6,7).
Como Tamar não havia engravidado, o irmão mais novo de seu marido deveria assumi-la como esposa e suscitar descendência ao marido falecido conforme a lei do levirato (Gênesis 38:8). O problema é que Onã, o irmão mais novo de Er que tomou Tamar como esposa, também era um homem mau.
Uma vez casado com Tamar, Onã se negou a engravidá-la para não gerar posteridade a seu irmão. Isso porque o seu primeiro filho com Tamar seria contado como o filho mais velho de seu irmão que era o primogênito na casa de seu pai. Em outras palavras, o direito de primogenitura de Er não seria mais dado a Onã, mas seria concedido ao seu filho com Tamar.
Então para evitar ter um filho com Tamar, Onã praticava o coito interrompido – um dos métodos contraceptivos naturais mais antigos na história da humanidade (Gênesis 38:9). A atitude de Onã foi perversa, egoísta e depravada. Ele desrespeitou Tamar e apenas a usou para satisfazer seus próprios desejos.
O resultado da conduta de Onã também foi a morte (Gênesis 38:10). Depois da morte de Onã, Judá enviou sua nora viúva de volta à casa dos pais dela, mas prometeu que quanto seu filho mais novo fosse um homem ele lhe daria em casamento (Gênesis 38:11).
Essa era apenas uma desculpa de Judá que supersticiosamente enxergou Tamar como uma mulher que trouxe desgraça aos seus filhos. Então na verdade Judá tinha medo de que Selá, seu filho mais novo, também viesse a morrer como seus irmãos. Ele não percebia que seus outros filhos foram mortos por causa da própria impiedade deles.
O plano de Tamar (Gênesis 38:12-23)
Tamar era uma viúva sem descendência. Isso basicamente significava que Tamar estava condenada a um futuro de desgraça e abandono, a menos que Judá honrasse sua palavra e o costume do levirato e entregasse seu filho mais novo para desposá-la. Mas não foi isso que aconteceu. Judá realmente não queria que mais um filho seu se casasse com Tamar.
Então num certo momento Judá subiu a um lugar chamado Timna para tosquiar as ovelhas. No mundo antigo a tosquia das ovelhas geralmente era associada a uma grande festa que envolvia práticas pagãs de culto à fertilidade. Tamar ficou sabendo que seu sogro estava ali e viu naquela oportunidade a única forma de garantir seus direitos e proteger a herança de seu marido falecido (Gênesis 38:12-14).
Para tanto, Tamar se disfarçou de prostituta cultual e com o rosto coberto se aproximou de Judá (Gênesis 38:15). Obviamente o plano de Tamar revelava o tipo de conduta imoral que caracterizava Judá. De alguma forma ela sabia que ele se interessaria e não resistiria a uma prostituta.
Conforme planejado por Tamar – que estava com o rosto coberto –, Judá não a reconheceu. Então ela negociou um preço para ter relações com Judá, a saber, um cabrito que lhe seria enviado depois. Mas Tamar pediu a Judá uma garantia de que o pagamento seria honrado.
Então ela pediu que Judá lhe deixasse seu selo, o seu cordão e o seu cajado. Esses três itens eram objetos identificadores irrefutáveis. No antigo Oriente Próximo um homem proeminente carregava um selo cilíndrico preso a uma corda ao redor do pescoço. Esse selo servia para assinar contratos.
Judá cedeu às exigências de Tamar e teve relações com ela – sem saber que estava se relacionando com sua própria nora. Depois disso Tamar foi embora, tirou o véu que cobria seu rosto e voltou a vestir as vestes características de uma viúva (Gênesis 38:19). Mais tarde, quando Judá enviou o pagamento conforme acordado com Tamar, nenhuma prostituta cultual foi encontrada naquele lugar (Gênesis 38:20-23).
A revelação do pecado de Judá (Gênesis 38:24-30)
Três meses depois, Judá ficou sabendo que sua nora Tamar estava grávida. Rapidamente Judá ordenou que ela fosse executada por ser culpada de imoralidade. Mas antes que Tamar pudesse ser queimada, ela revelou que havia concebido do homem que era dono do selo, do cordão e do cajado que estavam em sua posse (Gênesis 38:24,25).
Diante dessa revelação Judá reconheceu que havia negligenciado suas obrigações legais, enquanto Tamar havia permanecido fiel na defesa dos direitos de herança. Por isso Judá anulou a sentença de morte e declarou que Tamar era mais justa do que ele. Depois disso, a Bíblia diz que Judá nunca mais teve relações com Tamar (Gênesis 38:26).
Tamar acabou engravidando de gêmeos. Ao dar à luz, algo curioso aconteceu. O braço de um dos gêmeos saiu primeiro e a parteira o marcou com um fio identificando-o como primogênito. Mas o menino recolheu a mão e o outro gêmeo acabou nascendo primeiro. Este foi chamado Perez, e o outro foi chamado Zera (Gênesis 38:27-30).
Essa desastrosa história de Judá e Tamar aponta para a misericórdia e a graça de Deus. Isso porque Perez, o primogênito dos gêmeos frutos de uma relação imoral, acabou sendo contado na genealogia de Jesus Cristo. Ele entrou na linhagem messiânica sendo um ancestral do rei Davi através de Boaz, o marido de Rute (Rute 4:18-22; cf. Mateus 1:3). Assim, Gênesis 38 nos lembra de que o eterno propósito divino não pode ser frustrado pela imperfeição humana.