A Igreja Primitiva era a igreja do tempo dos apóstolos, ou seja, a comunidade que viveu os primeiros anos da Igreja Cristã. A história da Igreja Primitiva se desenvolveu desde a primeira metade do século 1 d.C. até o final do mesmo século ou o início do seguinte quando provavelmente morreu João, o último apóstolo de Jesus.
Inclusive, o período da Igreja Primitiva faz parte de um período maior da história do Cristianismo chamado de “Igreja Antiga”. Esse período se estende até os anos 600 d.C., quando teve início a Igreja Medieval. Então para muitos comentaristas, a designação “Igreja Primitiva” é usada principalmente para identificar a Igreja do período dos apóstolos dentro dessa divisão maior que compreende toda a Igreja Antiga.
A origem da Igreja Primitiva
É amplamente aceito pelos estudiosos que a Igreja Primitiva teve origem no dia de Pentecostes, com o derramamento do Espírito Santo (Atos 2). No entanto, tudo isso ocorreu dentro de um pano de fundo mundo maior.
A Bíblia mostra claramente que a história da redenção foi planejada por Deus desde a eternidade (cf. Efésios 1). Isso quer dizer que Deus dirigiu a história soberanamente para que seu propósito fosse cumprido. Então no momento oportuno, isto é, na “plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho” (Gálatas 4:4).
Portanto, a Igreja Primitiva surgiu num cenário meticulosamente preparado por Deus. De fato, não haveria um momento mais adequado para a Igreja Primitiva do que aquele. Nos séculos anteriores, o mundo havia caminhado para uma unificação jamais vista.
O Império Grego, de Alexandre, o Grande, basicamente padronizou o idioma e a cultura. A filosofia grega influenciou muita gente, e o grego koiné se espalhou por toda aquela região, se tornando o idioma comum de todos aqueles povos. Nesse mesmo tempo também já havia judeus vivendo nas mais diversas regiões.
Então quando o Império Romano despontou, ele se aproveitou daquela unidade cultural e idiomática para trazer uma realidade singular. Diferentemente de outros impérios, o Império Romano conseguiu manter a paz em todo o seu domínio de forma incrível. Havia a famosa Pax Romana, com tropas imperiais mantendo a paz e a autoridade do imperador em toda a extensão do império.
Consequentemente, houve grande prosperidade, riqueza e desenvolvimento. A infraestrutura pública do Império Romano era algo sem igual para os padrões da época. Todo o império era ligado por estradas que facilitavam o comércio e a comunicação.
Então foi nesse cenário que o Evangelho começou a ser pregado, fazendo a Igreja Primitiva crescer rapidamente de Jerusalém para as cidades mais longínquas do mundo greco-romano, cumprindo-se a promessa do Senhor Jesus de que suas testemunhas pregariam o Evangelho “tanto em Jerusalém, como em toda a Judeia e Samaria, e até os confins da terra” (Atos 1:8).
A liderança da Igreja Primitiva
A Igreja Primitiva era liderada pelos apóstolos de Jesus. Esses homens foram escolhidos especialmente por Deus para junto dos profetas lançarem os fundamentos da Igreja (Efésios 2:20). É verdade que sabemos muito pouco sobre a maioria dos apóstolos depois da ascensão de Jesus ao Céu.
Mas o livro de Atos dos Apóstolos, que registra parte importante da história da Igreja Primitiva, mostra de forma destacada a atuação de alguns apóstolos na liderança da Igreja. O trabalho do apóstolo Pedro, por exemplo, recebe grande ênfase na primeira metade do livro de Atos. Parece que ele foi o principal porta-voz da Igreja Primitiva em seus primeiros anos.
Pedro assumiu um papel de líder na reunião em que se deu a escolha do novo membro do colégio apostólico que deveria ocupar o lugar deixado por Judas Iscariotes (Atos 1:15). Ele também foi o pregador no Pentecostes que, pela inspiração do Espírito Santo, trouxe um sermão que resultou na conversão de três mil pessoas (Atos 2).
No episódio envolvendo Ananias e Safira, Pedro foi ainda o líder da Igreja Primitiva que anunciou a disciplina àquele casal (Atos 5). Pedro também teve um papel importante no Concílio de Jerusalém que foi reunido para resolver a primeira controvérsia na Igreja Primitiva que dizia respeito à recepção dos crentes gentios na comunidade cristã (Atos 15). Parece que seu trabalho na Igreja Primitiva também incluiu obras missionárias em Antioquia e depois em Roma.
Ao lado de Pedro, o apóstolo João foi outro líder de destaque na Igreja Primitiva. Ele era uma das colunas da igreja de Jerusalém (Gálatas 2:9). Já no período final de sua vida, ele também teve alguma participação na igreja de Éfeso.
O apóstolo Paulo também foi uma das maiores lideranças da Igreja Primitiva. Natural da cidade de Tarso, Paulo era um perseguidor implacável dos cristãos que foi transformado por Cristo em um dos mais notáveis missionários da história da Igreja. Em suas viagens missionárias, Paulo fundou várias comunidades cristãs que fizeram a Igreja Primitiva crescer.
Além dos apóstolos, outros nomes influentes também foram muito ativos na Igreja Primitiva. Entre eles: Estevão, Filipe, Tiago, Judas, Barnabé, Silas, Marcos, Lucas, Timóteo, Tito, Apolo, etc.
Os membros da Igreja Primitiva
Sem dúvida a maioria dos membros da Igreja Primitiva era formada por pessoas simples, como camponeses e pescadores. Mas havia também membros de outras classes sociais. À luz dos textos do Novo Testamento, sabemos que entre os membros da Igreja Primitiva estavam judeus, gentios, homens, mulheres, jovens, velhos, soldados, senhores e escravos (Tito 2:1-10). Isso mostra que o corpo de membros da Igreja Primitiva era uma prova de que a graça de Deus foi manifestada trazendo salvação a todo tipo de pessoas, sem distinção (Tito 2:11).
Um ponto importante sobre os membros da Igreja Primitiva é a participação das mulheres. Isso é interessante porque no tempo da Igreja Primitiva havia muita discriminação para com as mulheres. No judaísmo, por exemplo, as mulheres não podiam ser ensinadas pelos rabinos, e nem podiam ser contadas no quórum das sinagogas.
Mas sabemos que biblicamente homens e mulheres são iguais perante o Senhor. Ambos são criados à imagem de Deus e desfrutam das mesmas bênçãos da salvação em Cristo (Gênesis 1:26,27; Gálatas 3:28). No entanto, também sabemos que a igualdade bíblica entre homens e mulheres não significa que não haja uma distinção de papeis e funções instituída por Deus. A liderança eclesiástica, por exemplo, foi confiada por Deus ao homem (cf. 1 Timóteo 3; Tito 1).
Mas isso não implica no desprezo das mulheres ou na diminuição do papel exercido por elas na Igreja. Muito pelo contrário! A atuação das mulheres na membresia da Igreja Primitiva é uma prova muito clara disso. Na verdade, as mulheres são citadas com destaque antes disso, ainda durante o ministério terreno de Jesus. Elas foram responsáveis em grande parte por dar suporte ao ministério itinerante de Cristo e seus discípulos. Foram elas, inclusive, as primeiras testemunhas da ressurreição de Jesus.
Esse empenho das mulheres continuou durante a história da Igreja Primitiva. Então como Dorcas, por exemplo, as mulheres eram discípulas de testemunho notável (cf. Atos 9:36); como Priscila, elas explicavam com clareza o Evangelho (Atos 18:26); como Lídia, elas abrigavam missionários (Atos 16:14,15); como Maria, mãe de João Marcos, elas abriam suas casas para a Igreja Primitiva se reunir (Atos 12:12); como as filhas do evangelista Filipe, elas profetizavam (Atos 21:9); como Febe, elas serviam à Igreja (Romanos 16:1); como Evódia e Síntique, elas eram cooperadoras dedicadas na obra do Senhor (Filipenses 4:2,3).
A organização e a reunião da Igreja Primitiva
O principal ofício de autoridade na Igreja Primitiva era o apostolado. Mas além dos apóstolos, havia também outros oficiais, como: profetas, evangelistas, pastores e mestres. Todas essas pessoas tinham em comum o fato de terem sido capacitadas pelo Espírito Santo de Deus de forma especial para servirem na Igreja de Cristo. Inclusive, essas pessoas basicamente eram dons do Senhor para a edificação da sua Igreja (Efésios 4:11).
A Igreja Primitiva estava espalhada por todo o Império Romano em várias comunidades locais. Essas comunidades locais eram regidas por presbíteros (bispos) que pastoreavam e ensinavam a igreja através da Palavra de Deus. Havia também nas comunidades locais os diáconos, que cuidavam de outros assuntos importantes da comunidade, como por exemplo, a assistência aos necessitados.
No tempo da Igreja Primitiva não havia templos para reunião da comunidade cristã. Os crentes de Jerusalém até usavam o Templo para orar. Praças e sinagogas espalhadas por todo o Império Romano muitas vezes também serviam de lugar para a pregação do Evangelho.
Mas como Igreja, os crentes se reuniam, principalmente, nas casas uns dos outros. Por exemplo: a casa de Maria, a mãe de João Marcos, era um ponto de encontro da igreja de Jerusalém. Outro exemplo é a casa de Filemom que servia de lugar de reunião para a igreja de Colossos (Filemom 1:2). Entre as reuniões da Igreja Primitiva estavam a celebração da Ceia do Senhor, a confraternização chamada de “Festa Ágape”, e reuniões de adoração, oração e ensino da Palavra.
A Igreja Primitiva não era perfeita
Sem dúvida a Igreja Primitiva tinha muitos pontos fortes que merecem ser elogiados. A Igreja Primitiva era uma igreja hospitaleira; uma igreja engajada em missões; uma igreja fervorosa e unida que persevera em oração; uma igreja centrada na defesa do Evangelho; uma igreja que colocava a causa da obra de Deus em primeiro lugar; uma igreja que não recuava diante da oposição e enfrentava com vigor as ameaças e as perseguições.
Nesse último ponto, a Igreja Primitiva viu seus grandes líderes sendo um a um martirizado, mas manteve firme seu compromisso com Cristo. Além disso, obviamente a Igreja Primitiva teve um papel fundamental para que o Evangelho chegasse até nós e hoje pudéssemos estar aqui servindo ao Senhor.
Mas a Igreja Primitiva também tinha os seus problemas. A Igreja Primitiva era duramente atacada por heresias disseminadas por falsos mestres e algumas vezes suas comunidades acabavam abrigando essas pessoas.
Em algumas comunidades havia problemas doutrinários, éticos, casos de divisão e imoralidade. Algumas comunidades da Igreja Primitiva perdiam o fervor e se tornavam apáticas. Na verdade, as sete igrejas do Apocalipse mostram de forma clara alguns dos problemas enfrentados na Igreja Primitiva.
Das sete igrejas da Ásia Menor, apenas duas não são repreendidas pelo Senhor Jesus. Inclusive, parte importante dos escritos do Novo Testamento foi dada justamente para corrigir erros graves que prejudicavam a vida cristã e que, portanto, já estavam presentes desde os tempos da Igreja Primitiva.
Mas apesar de todos os seus problemas, a Igreja Primitiva prevaleceu e foi a primeira base missionária que internacionalizou a pregação do Evangelho. Um grupo inicial de pouco mais de cem pessoas em Jerusalém no primeiro século, se tornou uma multidão incontável dedicada a fazer com que o nome de Cristo seja glorificado.
Isso mostra que a realidade da Igreja não repousa sobre as habilidades humanas. A principal qualidade da Igreja está no fato de ela ter sido alcançada pela graça de Deus. A Igreja pertence ao Senhor e Ele é quem preserva o seu povo firme até o fim (1 Coríntios 1:8). Foi assim com a Igreja Primitiva, é assim com a Igreja atual, e continuará assim até o dia em que Cristo vier buscar a sua Igreja.