A marca da besta, e o que significado o número 666 é certamente um dos temas mais discutidos dentro do livro do Apocalipse, e vários significados já foram sugeridos ao longo da História.
O texto em discussão está registrado no capítulo 13 do livro do Apocalipse, onde somos informados que a besta que subiu da terra ordena que todos os homens sejam marcados com a marca da besta que subiu do mar. A descrição de João chama ainda mais a atenção quando ele faz referência ao número 666.
A Marca da Besta:
E faz que a todos, pequenos e grandes, ricos e pobres, livres e servos, lhes seja posto um sinal na sua mão direita, ou nas suas testas,
Para que ninguém possa comprar ou vender, senão aquele que tiver o sinal, ou o nome da besta, ou o número do seu nome.
Aqui há sabedoria. Aquele que tem entendimento, calcule o número da besta; porque é o número de um homem, e o seu número é seiscentos e sessenta e seis.
(Apocalipse 13:16-18)
Quais as interpretações sobre a marca da besta?
Não é de hoje que as pessoas tentam atribuir significados a essa marca e ao número 666. Nas últimas décadas, várias coisas foram identificadas como “suspeitas” de serem a marca da besta. Já afirmaram, por exemplo, que a marca da besta seria o código de barras ou um chip.
Outras sugestões que já surgiram para a marca da besta foram: as faces da moeda americana de 10 centavos, a observância do domingo ao invés do sábado, etc. Vídeos conspiratórios não param de surgir na internet.
De forma geral, a interpretação mais conhecida sobre a marca da besta é a de que tal marca será um sinal único, individual e externo, que será implantado na fronte ou na mão direita dos homens em um momento específico da História, a saber, a grande tribulação.
Essa marca será usada como uma forma de controle pelo Anticristo, para identificar seus adoradores. Todos os homens deverão ser marcados. Quem não tiver a marca da besta e não adorar ao Anticristo como deus, não poderá comprar ou vender, sendo caçados para que sejam mortos.
Essa é a interpretação que ficou popularizada por uma série de livros e filmes sobre o tema, adotada geralmente pelos pré-milenistas dispensacionalistas, a posição escatológica mais recente dentro do cristianismo e que é predominante entre os cristãos, principalmente devido à seu grande apelo.
É importante ressaltar que essa corrente escatológica adota o estilo futurista de leitura do Apocalipse, apontando que a partir do capítulo 4 do livro, os relatos se destinam exclusivamente a um período futuro da história, na maioria das vezes entendido como sendo a grande tribulação, com duração de sete anos que será iniciado com um arrebatamento secreto da Igreja.
Outra interpretação sobre a marca da besta, essa mais tradicional dentro do cristianismo histórico, defende que a marca da besta está presente em todas as gerações, ou seja, Satanás sempre teve seus adoradores, os quais são marcados por ele.
Afinal, o que é a marca da besta?
Antes de responder essa pergunta, primeiramente é necessário que se compreenda a forma mais coerente de se interpretar o Apocalipse, considerando seu contexto histórico, propósito, suas características e estilo literário. Não podemos apenas isolar três versículos de um capítulo e sair atribuindo significados e construindo teorias.
O primeiro ponto é entender a expressão “marca da besta”, e em que João estava se baseando quando utilizou tal referência. Nos dias atuais é natural que o gado receba uma marca para que se identifique sua procedência e a fazenda a qual pertence.
Nos dias do Apóstolo João, os animais também já eram marcados, porém não apenas eles, as pessoas também eram. Algo muito comum na época era a marcação de escravos. O objetivo era o mesmo, servir como um sinal de propriedade, ou seja, o escravo marcado carregava consigo a marca de seu dono.
Também é verdade que não somente os escravos recebiam uma marca, outras classes também eram marcadas. Há indícios de que os soldados romanos recebiam algum tipo de marca de identificação, além dos devotos das religiões pagãs da época.
Naquela região da Ásia Menor, as pessoas mostravam sua devoção a um determinado deus recebendo uma marca que as identificasse como adoradoras de tal deus. Essa marca, na maioria das vezes uma tatuagem, era exibida com orgulho por esses devotos. Portanto, “receber uma marca” indicava que um determinado individuo cultuava, servia ou pertencia a alguém.
Tendo entendido essa primeira parte, agora podemos citar alguns versículos muito importantes para nossa compreensão:
E seguiu-os o terceiro anjo, dizendo com grande voz: Se alguém adorar a besta, e a sua imagem, e receber o sinal na sua testa, ou na sua mão,
Também este beberá do vinho da ira de Deus, que se deitou, não misturado, no cálice da sua ira; e será atormentado com fogo e enxofre diante dos santos anjos e diante do Cordeiro.
E a fumaça do seu tormento sobe para todo o sempre; e não têm repouso nem de dia nem de noite os que adoram a besta e a sua imagem, e aquele que receber o sinal do seu nome.
(Apocalipse 14:9-11)
De forma semelhante, no capítulo 20 e versículo 4, João viu que os que morreram pelo testemunho de Cristo e pela Palavra de Deus foram aqueles que “não adoraram a besta, nem a sua imagem, e não receberam o sinal em suas testas nem em suas mãos“. Assim, de acordo com os capítulos 13, 14 e 20, receber a marca da besta significa claramente pertencer à besta e adorá-la.
Outro ponto fundamental para entendermos essa passagem é o fato de João utilizar frequentemente o Antigo Testamento na construção de seus textos no Apocalipse. Logo, temos inúmeras referências dentro do Apocalipse que estão fundamentadas em passagens do Antigo Testamento.
Uma coisa que é fundamental para se ter em mente é que a Bíblia interpreta a própria Bíblia, ou seja, devemos comparar Bíblia com Bíblia, buscando nela mesma as informações necessárias que nos auxiliam na compreensão de algum texto considerado difícil.
Antes de procurarmos um vídeo conspiratório, ou um texto de “quase ficção”, devemos levar em conta esse princípio básico de interpretação bíblica. Daí, podemos nos perguntar: O que João quis dizer com ser marcado na fronte e na mão? Será que ele usou o Antigo Testamento nessa expressão?
Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor.
Amarás, pois, o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças.
E estas palavras, que hoje te ordeno, estarão no teu coração;
E as ensinarás a teus filhos e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e deitando-te e levantando-te.
Também as atarás por sinal na tua mão, e te serão por frontais entre os teus olhos.
(Deuteronômio 6:4-8)
Com o auxílio do texto acima, podemos perceber que a ideia de um povo marcado na fronte ou na mão tem origem no livro de Deuteronômio. Também percebemos que a expressão “atarás por sinal na tua mão, e te serão por frontais entre os teus olhos” tem um sentido figurado.
Ninguém iria atar literalmente os mandamentos de Deus na mão, ou pendurá-los na testa entre os olhos. Se fossemos entender de forma literal essa expressão, também precisaríamos considerar como literal a expressão “estas palavras, que hoje te ordeno, estarão no teu coração“. Creio que ninguém iria considerar a possibilidade de uma cirurgia para que tal ordem fosse cumprida.
A mensagem nesse texto é clara: todos os nossos pensamentos, vontades e ações, devem ser guiados pelos mandamentos de Deus. Outro texto interessante que também pode ter sido utilizado por João ao escrever o Apocalipse, está no livro do Profeta Ezequiel, onde um sinal na testa foi usado no sentido de preservação:
E disse-lhe o Senhor: Passa pelo meio da cidade, pelo meio de Jerusalém, e marca com um sinal as testas dos homens que suspiram e que gemem por causa de todas as abominações que se cometem no meio dela.
(Ezequiel 9:4)
Voltando ao Apocalipse, e com o auxílio do que aprendemos no Antigo Testamento, podemos facilmente compreender que a “mão direita” usada por João, refere-se às obras e as ações de uma pessoa, em todos os âmbitos de sua vida. A “fronte” simboliza a mente, a vida em termos de pensamento e filosofia.
Portando, receber a marca da besta na fronte e na mão direita, significa que uma pessoa pertence ao grupo contrário a Cristo e seus seguidores, de modo que em tudo o que ela pensa, diz, escreve ou faz, reflete o espírito anticristão que a governa, deixando evidente que, de uma forma ou de outra, suas ações ou filosofias perseguem a Igreja de Cristo.
Isso se aplica as mais diversas situações, desde o perseguidor que tortura e mata um cristão em alguma parte do mundo, até uma pessoa comum de uma grande cidade que apoia uma lei contrária aos mandamentos de Deus. Ambos possuem a marca da besta, e adoram a sua imagem.
Outra coisa interessante é que no livro do Apocalipse outro povo também é marcado:
Dizendo: Não danifiqueis a terra, nem o mar, nem as árvores, até que hajamos selado nas suas testas os servos do nosso Deus.
(Apocalipse 7:3)E olhei, e eis que estava o Cordeiro sobre o monte Sião, e com ele cento e quarenta e quatro mil, que em suas testas tinham escrito o nome de seu Pai.
(Apocalipse 14:1)
Isso nos mostra que a marca da besta é um tipo de imitação fraudulenta que Satanás usa para imitar o selo do nome de Deus que os santos recebem. Na verdade os santos recebem muito mais do que uma marca, eles recebem um selo.
Esse selo indica que alguém pertence a Cristo, guarda sua Palavra, dirige suas ações de acordo com seus mandamentos e seus pensamentos evidenciam a mente de Cristo (1Co 2:16). Por outro lado, quem não possui o selo de Deus possui a marca da besta.
Isso significa que o ímpio que persiste em iniquidades, e se satisfaz em sua vida de pecado, pertence a besta e adora a Satanás. Essa marca está presente nos homens em todas as épocas. Todos aqueles que não tiveram seus nomes escritos no livro da vida do Cordeiro, desde a fundação do mundo, são portadores dessa marca (Ap 13:8; 17:8).
Nos dias de João, os cristãos estavam sendo oprimidos violentamente por Roma. Eles tinham seus bens confiscados, eram perseguidos, torturados e brutalmente condenados à morte. O imperador Domiciano havia se autoproclamado deus, e exigia adoração de todos os habitantes do império. Qualquer um que se negasse a cumprir as ordens de Domiciano, não prestando-lhe culto, era delatado até mesmo por próprios parentes e, dentre outras coisas, eram impedidos de exercer qualquer ofício e realizar atividades econômicas.
Na cultura da época, o politeísmo era algo comum, portanto, os pagãos não tiveram dificuldades em adorar um deus a mais. Entretanto, os verdadeiros cristãos não aceitaram essa condição, pois aceitá-la seria negar a fé em Cristo. Diante disso, o que poderia se esperar do conflito entre um grupo de cristãos, em sua maioria formada por camponeses e pessoas simples, contra o maior império do mundo? Aos olhos humanos, aqueles dias pareciam significar o fim da Igreja.
É diante desse pano de fundo que o livro do Apocalipse foi escrito. Foi uma resposta de Cristo à sua Igreja, demonstrando que Ele estava atento ao que estava acontecendo, estava vendo as lágrimas e o sangue derramado, mas que nada daquilo estava fora de seu controle, pois o livro da História está em suas mãos (Ap 5:9,10).
Então, os verdadeiros cristãos foram convidados a perseverar, não aceitar a marca da besta e não adorar a Satanás. Por conta disso, muitos morreram, mas ficaram firmes na certeza de que reinariam com Cristo eternamente (Ap 20:4).
O livro do Apocalipse nos adverte que possuir o selo de Deus é ter a vida eterna, enquanto possuir a marca da besta é perecer eternamente (Ap 14:11; 20:4). Até mesmo em nossos dias, quantos irmãos não perdem empregos, passam necessidades e são impedidos de realizarem um negócio justo economicamente por permanecerem fieis aos seus princípios bíblicos? Por não possuírem a marca da corrupção desse mundo, imposta por Satanás, são duramente prejudicados.
As palavras do Apocalipse são tão atuais para nós hoje, como foi para os cristãos do primeiro século. A marca da besta atravessa os anos, e pode ser vista nitidamente em qualquer lugar ou momento histórico, a qual a besta recruta seus súditos a uma oposição a Deus e rejeição a Cristo.
Tudo isso também prefigura um período ainda vindouro, o período final da presente era, onde o Anticristo escatológico se manifestará, e perseguirá terrivelmente a Igreja de Cristo. Não sabemos quando isso ocorrerá, mas quando ocorrer, independente da época, a mensagem será a mesma: “Sê fiel até a morte, e dar-te-ei a coroa da vida“. “Aqui está a perseverança e a fé dos santos” (Ap 2:10; 13:10b).
O que podemos concluir sobre a marca da besta?
Nós vimos que existem várias interpretações diferentes sobre o assunto. Vimos também a necessidade de se considerar a própria Bíblia para nos auxiliar na compreensão do tema, bem como o contexto histórico para entendermos as características do momento em que o texto foi escrito.
O que fica claro é que não podemos isolar os textos do Apocalipse e aplicá-los apenas a um momento específico no futuro, pois fazendo isso, estaremos diminuindo a significância e a aplicabilidade das verdades presentes na Palavra de Deus. O Apocalipse foi tão atual para os irmãos do primeiro século, como é para nós hoje, e, mesmo tendo um significado prático e específico para eles, a mensagem necessariamente é a mesma.
O fato de a marca da besta definitivamente não ser um chip, um carimbo, um cartão ou qualquer outra coisa, não significa que o Anticristo escatológico não usará recursos tecnológicos como ferramentas para perseguir a Igreja. Ele possivelmente utilizará tudo o que tiver ao seu alcance para fazer com que todos os homens da terra o adorarem. Portanto, utilizar a tecnologia será apenas uma de suas facetas. O que não podemos, é restringir o significado de uma mensagem tão ampla e importante, apenas a um período específico da história.
A pergunta é simples: Qual a importância para aqueles irmãos das sete igrejas da Ásia Menor que estavam sendo perseguidos, presos e mortos, receber uma carta falando sobre chips, códigos e cartões utilizados no século 21? A resposta também é simples: Nenhuma!
Se esse fosse o real significado das mensagens do Apocalipse, aqueles irmãos teriam ficado decepcionados. Eles estavam sendo perseguidos, presos e assassinados, e precisavam de uma resposta de Deus sobre aquela situação, e não sobre o avanço tecnológico de dois mil anos depois.
Para nós, sem sombra de dúvida a mensagem também é muita clara. Viver em santidade, mesmo que isso custe a nossa própria vida, significa não receber a marca da besta. Satanás está marcando as pessoas, imprimindo nelas o padrão deste mundo, as práticas que afrontam aos mandamentos de Deus.
O resultado é que todos estão vivendo de forma tranquila e satisfeita, maravilhados com tudo o que o presente século os oferece. Eles estão adorando a imagem da besta e dedicando seus pensamentos e ações às causas dela. Esse é um alerta sério e urgente para todos nós: temos o selo de Deus em nossas vidas, não podemos ser iguais ao mundo, não podemos ser confundidos com os adoradores da besta. Saiba mais sobre o que é a marca da Besta.
Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos como um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional;
e não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que proveis qual é a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.
(Romanos 12:1,2)