A declaração bíblica que diz: “Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos” aponta para a abundante provisão de Deus para com os seus filhos. Diferentemente do que algumas pessoas pensam, essa frase não traz uma ideia barata de triunfalismo, mas uma certeza de que Deus cuida daqueles que são seus.
Foi o rei Davi quem escreveu essas palavras no Salmo 23. No verso 5 desse salmo nós lemos: “Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos; unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda” (Salmos 23:5).
Essa declaração faz parte de um salmo que começa com a metáfora do cuidado do pastor com seu rebanho para falar do cuidado do Senhor com seu povo. Isso fica evidente na declaração inicial: “O Senhor é o meu Pastor; nada me faltará” (Salmo 23:1). Essa figura de linguagem certamente persiste até o verso 4 onde o salmista confessa não ter medo de andar no vale da sombra da morte acompanhado da presença de seu Pastor. Tal como uma ovelha, ele encontra consolo na vara e no cajado de seu pastor.
Mas no verso 5, no qual o salmista emprega a frase: “Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos”, os estudiosos se dividem quanto ao entendimento acerca do que Davi tinha em mente quando escreveu essas palavras. Alguns acreditam que a metáfora do pastor e o rebanho persiste; enquanto que outros defendem que no verso 5 a figura do pastor dá lugar à figura do anfitrião que prepara um banquete para o seu convidado.
Preparas uma mesa perante mim
Os comentaristas que acreditam que a declaração: “Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos” ainda está ligada à metáfora do pastor e de suas ovelhas, geralmente dizem que essa frase diz respeito ao cuidado que o pastor provia ao seu rebanho quando o recolhia no aprisco.
Dentro do aprisco havia comida abundante para as ovelhas no fim do dia, e ali elas não apenas podiam se alimentar, mas também podiam repousar em segurança; apesar dos ladrões e dos predadores que por vezes se aproximavam do aprisco durante a noite – daí a ideia da mesa perante os inimigos. No aprisco ainda havia um grande cálice transbordante de água fresca. Além disso, frequentemente as ovelhas recebiam uma mistura de óleo em seus chifres para servir de repelente de insetos durante a noite.
Contudo, a interpretação mais amplamente aceita sobre esse verso bíblico é aquela que identifica uma mudança de metáfora. Parece que o salmista substitui a figura do pastor pela figura do anfitrião; a figura da ovelha pela figura do convidado que na antiguidade era recepcionado com óleo festivo num banquete abundante.
Na presença dos meus inimigos
O fato de o salmista citar a presença de seus inimigos no banquete tem levado os estudiosos considerarem que talvez Davi tivesse em mente um banquete promovido por um soberano ao seu vassalo. Nas cortes, era comum que um banquete marcasse a ascensão de um príncipe, de um líder ou de um vassalo perante a presença de vários rivais derrotados.
Outra possibilidade apontada pelos intérpretes é a de que o salmista tinha em mente os adversários derrotados e feitos prisioneiros que às vezes tinham que presenciar o banquete de triunfo promovido pelo soberano vitorioso enquanto exibia os espólios da batalha.
Seja como for, Davi já era um homem maduro quando disse: “Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos”. Ele já havia experimentado a oposição e a zombaria de seus adversários que, inclusive, menosprezavam sua confiança em Deus. Mas ao fazer essa declaração, Davi mais uma vez reforça sua confiança no Senhor como Aquele que lhe justifica e lhe dá o sustento; apesar da oposição daqueles que tentavam defraudá-lo.
Preparas-me um banquete na presença dos meus inimigos: os méritos são de Cristo
Definitivamente a frase: “Preparas um banquete para mim na presença dos meus inimigos” não consiste num motivo de vanglória para o crente. A Bíblia apresenta Cristo tanto como o Pastor que cuida de suas ovelhas e dá a vida por elas quanto como o Anfitrião que conduz o seu povo à casa do Pai (João 10:11-16; 14:1-3).
Se temos algum favor da parte do Senhor isso se dá pelos méritos de Cristo. Se somos aceitos na família de Deus isso se deve à justiça de Cristo. Curiosamente no salmo anterior (Salmo 22) temos uma descrição da razão pela qual agora podemos dizer que Deus prepara um banquete para nós na presença dos nossos inimigos. O mesmo salmista que escreveu essa frase é também aquele que escreveu as palavras da agonia de Jesus Cristo na cruz: “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?” (Salmos 22:1; cf. Mateus 27:46).
Cristo se fez pecado por nós e foi abandonado pelo Pai no Calvário. Ele satisfez de forma perfeita a justiça divina e conquistou para nós um lugar no banquete celestial na bem-aventurança eterna. Então a declaração: “Preparas um banquete para mim na presença dos meus inimigos” não fala sobre como somos importantes; mas fala sobre a graciosa misericórdia do Senhor. Essa declaração não fala sobre um triunfalismo superficial baseado em justiça própria; mas fala sobre como somos feitos vitoriosos pelas bênçãos imerecidas que o Senhor derrama continuamente sobre nós.