Quando a Bíblia fala na obra da salvação aplicada ao pecador, ela revela que há um processo da salvação. Esse processo da salvação possui tanto aspectos imediatos quando progressivos.
Isso significa que a salvação em Cristo Jesus não acontece num único ato em que Deus concede ao pecador a plenitude da salvação. Existe também um processo que perdura toda a vida do redimido e encontra sua plenitude na vida vindoura. A salvação é pela graça mediante a fé, e o processo da salvação deve ser visto como sendo o modo com que essa graça é manifestada e cumprida no homem.
O processo da salvação na Bíblia: Ordo Salutis
Quando se fala no processo da salvação, logo os cristãos se lembram de três elementos fundamentais na salvação: regeneração, justificação e santificação. No entanto, há outras etapas que antecedem ou sucedem esses três elementos. A Bíblia também fala em eleição e predestinação, chamado, conversão (que envolve fé e arrependimento), perseverança e glorificação. Saiba o que é regeneração na Bíblia.
Sem dúvida a Bíblia aponta para um processo da salvação, mas não específica exatamente uma ordem em que esse processo ocorre. O texto mais próximo de uma sequência das fases da salvação é Romanos 8:28-30. Paulo escreve que Deus chamou certas pessoas segundo o seu decreto. A estes Ele conheceu de antemão e predestinou para serem conforme a imagem de seu Filho. E aos que predestinou, também chamou, justificou e glorificou. Entenda o que significa predestinação na Bíblia.
Mas na teologia essa ordem do processo da salvação é discutida e esboçada. Os teólogos utilizam a expressão latina Ordo Salutis, que significa “ordem da salvação”, para se referir a esse processo.
Embora antes da Reforma Protestante já houvesse alguma reflexão acerca da ordem da salvação, essa discussão ganhou destaque dentro da Teologia Reformada. Mas também é verdade que os protestantes não são unânimes no entendimento sobre o processo em que ocorre a salvação no pecador.
Diferentes interpretações sobre o processo da salvação
Realmente existem muitas discussões sobre o processo da salvação dentro das diferentes linhas teológicas. São tantas variações que muitas vezes nem mesmo proponentes da mesma linha teológica concordam entre si.
Aqui iremos considerar simplesmente a ordem mais comum nas três principais linhas teológicas do Protestantismo: luterana, calvinista e arminiana. Antes, vale dizer que a discussão sobre o processo da salvação recua até a doutrina da eleição e predestinação. Esse debate ocorre especialmente entre calvinistas e arminianos.
Os calvinistas afirmam que o ponto inicial é a eleição e a predestinação, com base unicamente na vontade soberana de Deus. Já os arminianos afirmam que tudo começa com a presciência. Isso significa que Deus teria visto de antemão aqueles que iriam responder favoravelmente a oferta da salvação. Com base na fé e arrependimento previstos, Deus então teria elegido e predestinado aqueles que pertenceriam ao seu povo.
Calvinistas e arminianos clássicos concordam numa coisa: Deus aplica a redenção àqueles que Ele escolheu ainda na eternidade, embora eles discordem sobre como essa escolha acontece.
O processo da salvação no Luteranismo
Os cristãos luteranos não negam a doutrina da eleição e predestinação, mas focam seu ponto de partida do processo da salvação naquilo que acontece no e da parte do homem.
Eles começam afirmando que em Cristo Deus se reconciliou com o mundo. É através do Evangelho que Deus anuncia este fato ao homem. Então essa vocação vem acompanhada de iluminação, para que o homem tenha a capacidade de não resistir à obra do Espírito Santo. Resultante disto ocorre o arrependimento, e do arrependimento ocorre a regeneração.
Estes atos (vocação, iluminação, arrependimento e regeneração), são apenas preparatórios para a vinda do pecador a Cristo. Assim, a salvação só é conferida efetivamente quando o pecador exerce a fé. Pela fé ele se apropria do perdão e justificação objetivamente dados em Cristo.
Então o pecador é adotado como filho de Deus e é unido a Cristo (união mística). Segue-se ainda a santificação e a conservação. A manutenção de todas essas bênçãos depende da continuidade da fé.
O processo da salvação no Arminianismo
Os cristãos arminianos começam destacando a graça preveniente. Para eles, nesse ponto Deus habilita o homem caído com a condição de aceitar ou recusar o chamado do Evangelho. Ele é capacitado a resistir ou receber a graça de Deus.
Então segue-se o chamado externo (que pode ser rejeitado ou recebido). Quando o pecador decide aceitar esse chamado, ocorre a conversão, com arrependimento e fé. Após isto, o Espírito Santo realiza a regeneração. Então é implantada no pecador uma nova natureza. Depois disto vem a justificação, a santificação e a glorificação. Saiba mais sobre o que é a santificação.
Processo da salvação no Calvinismo
Os cristãos calvinistas afirmam que a aplicação da redenção aos eleitos no tempo, inicia-se com o chamado do Evangelho. Esse chamado torna-se eficaz com a regeneração, onde o Espírito Santo vivifica o pecador morto em delitos e pecados.
Como foi lhe dada uma nova natureza, a graça de Deus é irresistível ao regenerado, e ele responde com fé e arrependimento. Assim se relacionam a regeneração e conversão. Se a regeneração é uma obra do Espírito Santo no subconsciente, a conversão é algo que ocorre no consciente. Nesse ponto, o pecador é convertido do pecado a Cristo. Aqui não se trata de algo forçado, mas de um desejo natural de seu novo coração.
O pecador nasceu de novo, creu em Cristo e se arrependeu de seu pecado, e agora deseja e ama as coisas de Deus. Naturalmente ele também é justificado. Deus imputa a justiça de Cristo naquele que crê na plenitude da obra redentora de seu Filho.
Segue-se então a santificação, que é um processo que dura toda a vida do crente. A santificação é um processo imperfeito nessa vida, mas eficaz, no sentido de que os santos perseverarão até o fim. Por fim, o processo da salvação alcança seu cumprimento pleno e final com a glorificação.
Conclusão sobre o processo da salvação
Quando se fala no processo da salvação, ou numa ordem da salvação, deve-se sempre ter em mente que a aplicação da graça de Deus ao pecador é um processo unitário. Porém, esse processo pode ser distinguido em vários aspectos ou movimentos.
Além disso, também é importante ressaltar que o processo da salvação não consiste numa ordem temporal e cronológica. É a ordem lógica que é discutida, e não a cronológica. Então devemos entender essa questão como uma discussão acerca do processo lógico da salvação.
De fato a Bíblia não estabelece uma ordem específica sobre o processo da salvação. Porém, ela indica em várias passagens como os diferentes aspectos desse processo acontecem e se relacionam. Ela diz que:
- O estado do homem natural é de morte espiritual (Efésios 2:1-4).
- Que a regeneração é obra do Espírito Santo (João 3).
- Que somos gerados de novo mediante a Palavra de Deus (1 Pedro 1:23).
- Que a fé vem pelo ouvir, e o ouvir pela Palavra de Deus (Romanos 10:17).
- Que somos justificados pela fé, e não pelas obras (Romanos 3:30; 5:1; Gálatas 2:16-20).
- Que os justificados têm paz com Deus (Romanos 5:1,2).
- Que os que foram feitos novas criaturas foram feitos servos da justiça e andam em santificação (Romanos 6:18,22).
- Que somos adotados por Deus como filhos em Cristo e somos co-herdeiros dele (Romanos 8:15-17; Gálatas 4:4-6).
- Que ao crermos em Cristo, somos selados com o Espírito Santo da promessa, que é o penhor da nossa herança. Isso implica na segurança da salvação e na certeza da glorificação futura (Efésios 1:13,14).
Com tudo, o fundamental a ser entendido no processo da salvação é que tudo é pela graça de Deus. A salvação não é uma obra do homem, mas do Senhor. O homem não possui qualquer mérito nesse processo.