Podemos Fazer Milagres Maiores Que os de Jesus?

Algumas pessoas defendem que se tivermos fé poderemos fazer milagres maiores que os de Jesus. Não é raro nas igrejas ouvirmos a afirmação de que Jesus falou que faríamos milagres maiores do que os que Ele fez. O texto usado para defender essa ideia está no Evangelho de João:

Na verdade, na verdade vos digo que aquele que crê em mim também fará as obras que eu faço, e as fará maiores do que estas, porque eu vou para meu Pai.
(João 14:12)

Esse versículo é o preferido de muitas pessoas que se intitulam pregadores, pastores, bispos, missionários, apóstolos, profetas e milagreiros. Essas pessoas tentam usar esse versículo para justificarem suas experiências, ensinos e rituais que contrariam a Palavra de Deus.

Mas será que é isso mesmo que a Bíblia Sagrada nos diz? Realmente podemos fazer milagres maiores que os de Jesus?

Aquele que crê em mim também fará as obras que eu faço

Analisando cuidadosamente o texto de João, é fácil perceber que essa é uma interpretação equivocada; embora seja a interpretação mais comum no meio evangélico.

Antes de tudo, é bom conhecermos o contexto que envolve essa promessa de Jesus em João 14:12. Esse capítulo fala dos momentos finais de Cristo antes de ser preso e crucificado no Calvário. Nesse mesmo capítulo Jesus alertou os discípulos sobre as coisas que estavam para acontecer; falou do Espírito Santo como o Consolador que seria enviado; e tranquilizou seus discípulos dizendo que um dia haveria de voltar.

Jesus também fez uma afirmação muito importante. Ele disse que iria para o Pai para preparar-lhes lugar (João 14:2). Foi diante dessa afirmação que Tomé se mostrou temeroso sobre como eles chegariam até o lugar preparado por Cristo (João 14:5). Em seguida, Filipe completou o raciocínio pedindo para que Jesus lhes mostrasse o Pai (João 14:8).

Jesus então explicou de forma direta que Ele e o Pai são um, porque Ele está no Pai e o Pai n’Ele (João 14:9-11). Para compor essa explicação, Jesus então relembrou as obras que Ele realizou como evidencia dessa unidade entre Ele e o Pai. Dito isso, Jesus fez a promessa presente no versículo 12 dizendo: “Aquele que crê em mim também fará as obras que eu faço, e as fará maiores do que estas, porque eu vou para meu Pai”.

O que são as “obras maiores”?

A interpretação de que as tais obras maiores prometidas por Jesus se refira diretamente a milagres, causa uma série de problemas. Ela instiga o surgimento de heresias e ainda ignora o que realmente foi dito por Jesus. Vejamos abaixo alguns problemas dessa interpretação.

Em primeiro lugar, o termo grego ergon, utilizado originalmente no texto e traduzido como “obras”, literalmente significa “trabalho” em um sentido amplo. Assim, fica claro que essas obras não são exclusivamente milagres. Essas obras são muito mais abrangente. Elas incluem todo o ministério de Jesus na terra fundamentado em sua obra salvadora, e tudo o que envolve a pregação do Evangelho.

Um texto que explica claramente essa ideia é Mateus 4:23. Nesse texto lemos sobre Jesus ensinando nas sinagogas, pregando o Evangelho do Reino e curando as enfermidades dos doentes. É esse conjunto de ações que podemos entender como “obras”.

Em segundo lugar, os milagres, as curas e as expulsões de demônios, são consequências da pregação do Evangelho, e não o contrário. As obras realizadas por Jesus tinham, sobretudo, o objetivo principal de revelá-lo como Filho de Deus, além de compor o plano de salvação e glorificar o Pai (João 5:20; 17:4).

Em terceiro lugar, o mesmo Evangelho de João afirma que Jesus fez tantas coisas que seria impossível registrar em livros (João 21:25). Além disso, o livro de Atos dos Apóstolos e as epístolas do Novo Testamento testificam que muitos milagres foram realizados no início da Igreja Cristã. No entanto, não encontramos o relato de nenhum apóstolo superando os milagres de Jesus.

No decorrer da história da Igreja também temos notícias de milagres. Porém, nenhum dos milhões de cristãos piedosos de todo esse período realmente fez milagres maiores que os de Jesus..

Em quarto lugar, essa interpretação causa outro problema que está na implicação da frase de Jesus. O Senhor afirma que essas obras maiores seriam para os que cressem nele. Isso significa que Jesus afirmou categoricamente que aqueles que cressem nele necessariamente fariam tais obras. Se essas obras são os milagres, então todos nós somos incrédulos e não cremos em Jesus.

A maioria dos homens de Deus que foram líderes da Igreja ao longo da História desde a época dos apóstolos, nunca ressuscitou mortos; nunca andou sobre as águas; nunca repreendeu com êxito uma tempestade; nunca foi capaz de multiplicar o alimento de forma extraordinária; e nunca conseguiu transformar água em vinho.

Na verdade, muitos desses homens não foram capazes de curar nem mesmo gripe através de seu ministério! Mas por outro lado, eles tiveram uma fé tão extraordinária em Jesus que fizeram obras maiores. Eles anunciaram o Evangelho a uma multidão tão grande de pessoas em uma época que nem mesmo energia elétrica existia. Mesmo hoje, com todos os recursos que temos, a maioria de nós não chegará nem perto do que eles fizeram em prol do avanço do Reino de Deus na terra.

Em quinto lugar, acreditar que nesse texto Jesus está prometendo um festival de milagres, ignora o restante do versículo. Jesus termina sua promessa dizendo: “porque eu vou para meu Pai”. Com isso Jesus fala sobre a limitação da atuação de seu ministério terreno. Ele estava limitado em seu corpo humano, e as obras que Ele realizava estavam concentradas onde sua presença física atuava.

Mas quando Jesus Cristo declarou sua ida para o Pai, então Ele afirmou que essas obras seriam expandidas, de forma que a pregação do Evangelho alcançaria o mundo inteiro. Em Atos 2, por exemplo, já podemos ver o cumprimento de tal promessa com os apóstolos realizando obras maiores em quantidade e em alcance. Conheça os milagres de Jesus.

A Igreja foi habilitada a fazer obras maiores que as de Jesus

Desta forma, fica claro que as obras maiores prometidas por Jesus aos que crerem se referem à pregação do Evangelho da salvação e à expansão do Reino de Deus pelo mundo. Já as demais coisas, inclusive os milagres, são consequências que envolvem esse objetivo maior da Igreja.

Quanto a fé que Jesus mencionou no texto e que caracteriza “aquele que crê”, não é um tipo de fé forte para a realização de milagres, mas é a fé salvadora em Cristo Jesus. Esse entendimento precisa estar vivo dentro de cada cristão verdadeiro. A verdade da Palavra de Deus não jamais deve ser trocada por ventos de doutrinas humanas. Saiba o que é a fé.

Todos os dias nós, que somos a Igreja de Cristo, somos convidados à realizar obras maiores. Nossas redes sociais atingem milhares de pessoas; nossos vídeos são vistos no mundo inteiro; e nossos telefones transpassam fronteiras. A oportunidade está em nossas mãos, mas muitas vezes a última coisa que lembramos é que o “obras maiores” de João 14:12 está diretamente ligado ao “fazei discípulos“ de Mateus 28:19.

Certa vez escutei algo curioso de uma pessoa que estava saindo de uma determinada comunidade cristã. Ela disse que o motivo de sua saída era o fato de que nessa igreja não ocorriam milagres, curas e exorcismos. Segundo ela, todos os cultos pareciam estudos bíblicos; e lá não havia espaço para a realização de supostos cultos de libertação.

Eu argumentei que ela deveria ficar feliz. Se todos os cultos pareciam estudos bíblicos, então na verdade todos os cultos eram de libertação. Não existe uma forma de libertação que não seja pelo ensino da Palavra de Deus. Como já dá para imaginar, meu argumento não funcionou. Essa pessoa saiu e foi procurar uma igreja que realmente tivesse “poder” e “movimento”.

Isso me fez pensar bastante sobre o assunto. Me fez reconhecer que tantas igrejas que prezam pela verdadeira Palavra de Deus estão com suas cadeiras vazias e sendo apelidadas de “frias” e “carnais”. Já outras igrejas que são movidas pelo pragmatismo e sincretismo religioso, estão completamente lotadas e sendo intituladas como “igrejas de fogo” e “centros de milagres”. Mas as supostas pregações poderosas dessas igrejas não passam de uma oferta de um novo evangelho; um evangelho sem Cristo, sem regeneração, sem arrependimento e sem santificação.

Eu creio em milagres, pois Deus é poderoso para realizar o impossível quando, onde e quantas vezes quiser. O que eu não creio é em super-heróis de púlpitos que são verdadeiros artistas da fé. Eles promovem cultos que mais se parecem com shows de mágica e ilusionismo. Eles proclamam uma pregação carregada de superstições e que em nada tem a ver com o Evangelho de Cristo. Sobre estes, mesmo que façam descer fogo do céu, ainda assim minha fé em Cristo Jesus não será dividida.

Sobre isso, o apostolo Paulo escreve: “Mas ainda que nós, ou um anjo do céu, pregue um evangelho diferente daquele que lhes pregamos, que seja amaldiçoado!” (Gálatas 1:8). Há uma frase de Martinho Lutero que cabe muito bem nesse conceito. Ele diz que “qualquer ensinamento que não se enquadre nas Escrituras deve ser rejeitado, mesmo que faça chover milagres todos os dias”.

Jesus jamais prometeu que faríamos milagres maiores que os dele. O que Ele prometeu é que a chegada do Reino de Deus não seria frustrada. A Igreja militante, movida pela fé genuína em sua pessoa, faria obras maiores. Essas obras compreende tudo o que envolve a proclamação do Evangelho pelo mundo.