Sara Era Irmã de Abraão?

A Bíblia diz que Sara era irmã de Abraão por parte de pai em Gênesis 20:12. No versículo bíblico, o próprio Abraão afirmou que Sara era sua irmã, filha de seu pai, mas não de sua mãe. Porém, esse versículo tem gerado muita discussão entre os estudiosos sobre qual deve ser sua melhor interpretação.

Alguns comentaristas sugerem que talvez Sara não fosse necessariamente uma irmã direta de Abraão. Segundo essas pessoas, Sara poderia ser sua sobrinha, ou mesmo sua irmã adotiva, seja por ocasião do casamento ou anterior a ele. Vamos entender melhor as implicações da afirmação bíblica de que Sara era irmã de Abraão.

Quando Abraão disse que Sara era sua irmã?

Pelo menos por duas Abraão disse que Sara era sua irmã. A primeira ocorreu durante sua peregrinação no Egito. Abraão pediu que Sara — que naquele tempo era chamada de Sarai —, dissesse no Egito que ela era sua irmã, ao invés de dizer que era sua esposa.

Abraão considerou que a beleza de sua esposa poderia lhe colocar em perigo. Ele acreditou que quando os egípcios vissem Sara, eles o matariam para tomá-la por mulher. Então Abraão entrou no Egito dizendo que Sara era sua irmã, e ela, por sua vez, sustentou a informação do marido (Gênesis 12:11-13).

A segunda vez que Abraão disse que Sara era sua irmã foi na cidade de Gerar. O episódio foi muito parecido com aquele ocorrido no Egito. Abraão teve medo que os homens de Gerar quisessem matá-lo para ficar com sua esposa. Então novamente ele disse em Gerar que Sara era sua irmã (Gênesis 20:2).

Tanto no Egito quanto em Gerar, a atitude de Abraão ao esconder o seu relacionamento trouxe grandes problemas. No Egito, Faraó levou Sara para sua casa, pensando que ela era uma mulher livre (Gênesis 12:15). Em Gerar, o rei Abimeleque levou Sara para o seu harém (Gênesis 20:2).

Em ambos os lugares, Abraão foi duramente repreendido quando sua mentira foi descoberta. Inclusive, só não aconteceu algo pior porque Deus não permitiu. Mas foi em Gerar que Abraão explicou exatamente que, de fato, Sara era sua irmã que veio a se tornar sua mulher. Nesse sentido, ele disse: “E, na verdade, é ela também minha irmã, filha de meu pai, mas não filha de minha mãe; e veio a ser minha mulher” (Gênesis 20:12). Essa explicação de Abraão não tornou o seu erro menos vergonhoso.

Sara era a irmã de Abraão ou era sua parente?

No texto bíblico que afirma que Sara era irmã de Abraão, lemos a declaração do próprio Abraão: “é também minha irmã”. A palavra hebraica traduzida por “irmã” pode até ser aplicada num sentido mais amplo para se referir a uma parente. Isso poderia incluir uma sobrinha, uma prima, etc. O próprio Abraão, por exemplo, fala de , seu sobrinho, como se fosse seu irmão (Gênesis 13:8). Mas sem dúvida o sentido principal dessa palavra é mesmo o de irmã, filha dos mesmos pais.

Em seguida, Abraão completa: “filha de meu pai e não de minha mãe”. Nessa parte Abraão esclarece que seu parentesco com Sara é apenas por parte de pai, não de mãe. A palavra hebraica traduzida por “filha” também pode se referir a uma filha adotiva e, num sentido ainda mais amplo, a uma neta ou até mesmo a uma nora.

É por isso que muitos intérpretes entendem que não é fácil afirmar de forma absoluta que Sara era a irmã de Abraão, no sentido de ser filha de sangue de seu pai. E diante dessa dificuldade, os estudiosos tem apresentado pelo menos duas alternativas principais.

Sara era irmã de sangue de Abraão

A primeira alternativa interpretativa é aquela que segue a leitura mais natural possível do texto bíblico e considera que Sara era mesmo irmã de Abraão por parte de pai; ou seja, segundo essa interpretação, Sara era meia-irmã de Abraão.

Essa posição tem sido a mais adotada pela maioria dos estudiosos cristãos. O fato de Abraão ter se casado com a própria irmã não deve ser visto como algo problemático à luz do contexto em que ele viveu.

Primeiro, Abraão foi criado na Mesopotâmia sob leis e costumes pagãos. Naquele tempo os casamentos com parentes próximos — incluindo irmãos — não era apenas tolerado, mas muitas vezes esperado.

Segundo, Deus proibiu esse tipo de relacionamento entre irmãos apenas quinhentos anos depois de Abraão, quando Ele deu a Lei a Moisés. Portanto, Abraão não poderia ser responsabilizado por não se enquadrar numa lei que foi revelada muito tempo depois de sua morte.

Um questionamento que às vezes é levantado contra essa interpretação, é o fato de em momento algum Sara ter sido citada entre os filhos de Terá. Quando a Bíblia registra a descendência de Terá, apenas Abraão, Harã e Naor são mencionados como seus filhos (Gênesis 11:26). No entanto, esse problema pode ser facilmente resolvido considerando que, no geral, as genealogias antigas priorizavam os filhos homens e omitiam as filhas mulheres de uma determinada geração.

Sara era irmã adotiva de Abraão e podia ser sua sobrinha

Essa segunda interpretação sugere que Sara era irmã adotiva de Abraão. Dentro dessa interpretação há algumas variações.

Alguns acreditam que Sara era sobrinha de Abraão, filha de Harã e neta de Terá. A ideia é que como Harã morreu ainda jovem, seu pai, Terá, pode ter adotado seus netos como filhos. Isso então fazia de Sara, sobrinha de Abraão, sua irmã legitima por adoção.

Mas como o texto bíblico diz que Harã foi pai de Ló, Milca e Iscá, geralmente quem adota essa interpretação entende que Iscá era um nome alternativo para Sarai (Gênesis 11:27-29). Dessa forma, Abraão e Naor teriam se casado com as filhas órfãs de seu irmão Harã, já que Naor também se casou com Milca.

Muitos intérpretes judeus adotam essa interpretação. Por isso ela está presente em vários comentários rabínicos. O historiador Flávio Josefo também reproduz essa interpretação em sua obra Antiguidades Judaicas, ao afirmar que Sara era sobrinha de Abraão.

Outros acreditam que Sara foi adotada por ocasião de seu casamento com Abraão. Isso implicaria no fato de que Sara podia ser desde sua sobrinha até uma pessoa que não tivesse qualquer laço sanguíneo com ele.

Essa hipótese é baseada em algumas descobertas arqueológicas feitas na região da antiga Mesopotâmia. O assiriólogo Ephraim A. Speiser, por exemplo, observou que hurrianos — que eram influentes em Harã — tinham uma relação esposa-irmã. Nessa relação, o marido adotava sua esposa como irmã para tornar sua relação mais forte e solene no aspecto jurídico. Em outras palavras, ao fazer de sua esposa uma filha legitima de seu pai, o marido aumentava a autoridade e a posição de seu casamento com ela.

Parece que ao também ser irmão adotivo, o marido exercia ainda mais autoridade sob a esposa. Por outro lado, ao se tornar irmã adotiva, a esposa também desfrutava de um maior amparo legal e status social. Mas é impossível afirmar que esse tipo de relacionamento tenha existido na família de Abraão que era natural de Ur.

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Qual a melhor interpretação?

Todas as interpretações possuem algum sentido. Mas embora não seja impossível que Sara fosse uma irmã adotiva de Abraão — sendo ela sobrinha dele ou não —, continua sendo verdadeiro o fato de que a leitura natural do texto bíblico favorece a interpretação de que Sara era irmã de Abraão por parte de pai.

Como foi dito, o texto bíblico afirma com muita naturalidade que Sara era meia-irmã de Abraão, filha de Terá; e apesar de as palavras “irmã” e “filha” também possuírem uma aplicação mais ampla, seus sentidos principais continuam sendo estes, isto é, “irmã” e “filha”.

O fato de comentários rabínicos defenderem que Sara era sobrinha de Abraão não deve resolver a questão a favor dessa interpretação. Até porque dentro da própria tradição judaica há escritos que contam com considerável importância e que também reafirmam que Sara era mesmo meia-irmã de Abraão por parte de pai.

Então defender que Sara era sobrinha de Abraão ou filha adotiva de Terá, não significa exatamente contradizer o texto bíblico, mas significa depender de um arranjo maior no significado do texto para acomodar essa interpretação. Por isso a maioria dos intérpretes bíblicos cristãos continuam preferindo a interpretação de que Sara era irmã de Abraão.

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