O Melhor de Deus Está Por Vir?

Não há na Bíblia um versículo que diz que “o melhor de Deus está por vir”. Na verdade essa frase é apenas um jargão que se popularizou entre muitos cristãos. Na maioria das vezes ela é aplicada no sentido de afirmar que uma situação ruim será mudada porque Deus agirá trazendo algo melhor.

Mas aqui surge uma pergunta: Realmente é correto dizer que o melhor de Deus está por vir? A verdade é que do ponto de vista bíblico, essa frase em nossos dias de fato enfrenta uma série de dificuldades.

É correto dizer que o melhor de Deus está por vir?

Vamos abordar essa frase em duas perspectivas: ontológica e econômica. Em primeiro lugar, ontologicamente não faz qualquer sentido dizer que o melhor de Deus está por vir. Isso porque em Deus há perfeição absoluta. Deus é infinitamente perfeito, de modo que não há algo n’Ele que seja “melhor” ou “pior”; nada que provém d’Ele é passível de ser melhorado. Por toda a eternidade Deus é imutavelmente sem defeitos.

Em segundo lugar, podemos até considerar a frase: “o melhor de Deus está por vir” em sua aplicação no que diz respeito à obra de Deus na história da redenção. Se ontologicamente ela não faz sentido, economicamente ela tem o seu significado. À luz dos atos de Deus na história da redenção a frase: “o melhor de Deus está por vir” até pode ser bem aplicada.

Contudo, antes é preciso olhar a linha do tempo da história da redenção para entendermos em que ponto ela se encaixa de forma apropriada.

O tempo em que o melhor de Deus estava por vir

Após a Queda, a humanidade foi lançada num estado de rebelião contra Deus. Mas na mesma ocasião em que Deus anunciou a maldição por causa do pecado, Ele também fez um maravilhoso anúncio: “E porei inimizade entre ti e a mulher e entre a tua semente e a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar” (Gênesis 3:15). Nessa frase Deus basicamente anunciou que algo extraordinário haveria de acontecer para resolver a tragédia do pecado. Em outras palavras, esta foi a primeira anunciação do Evangelho ao homem.

Depois de ter fracassado diante de Deus e quebrado a aliança das obras, o homem foi apresentado à aliança da graça. Após ouvirem essa promessa, naquele estágio da história da redenção Adão e Eva de fato poderiam dizer: “O melhor de Deus está por vir”. A restauração da comunhão com Deus não se daria por seus próprios esforços e obediência, mas pelos méritos e obediência de um Redentor enviado de Deus através da semente da mulher.

Talvez essa expectativa explique a alegria de Eva quando lhe nasceu o primeiro filho: “Alcancei do Senhor um varão” (Gênesis 4:1). Seria ele o melhor de Deus que estava por vir? A história deixou claro que não. Tão grande foi o desastre do pecado na natureza humana, que o primeiro homem a nascer foi um assassino.

Mas essa expectativa continuou viva no decorrer da história. Isso fica claro nas palavras de Lameque por ocasião do nascimento de Noé: “Este nos consolará acerca de nossas obras e do trabalho de nossas mãos, por causa da terra que o Senhor amaldiçoou” (Gênesis 5:28).

Então ao longo da história do Antigo Testamento o povo de Deus conviveu com a expectativa de que o melhor de Deus estava por vir. Na verdade a frase: “o melhor de Deus está por vir” cabia muito bem na boca de um hebreu que viveu há mais de dois mil anos.

O tempo em que o melhor de Deus veio

Passaram-se muitos anos até que a promessa de Deus fosse cumprida. Por várias vezes Deus relembrou e renovou sua promessa. Várias pessoas, inclusive, foram levantadas por Ele como tipos de Cristo dando esperança ao povo, antes que o Antítipo realmente viesse. Assim, milhões de pessoas viveram na expectativa de que o melhor de Deus estava por vir.

Mas chegou o tempo, na história da redenção, em que o melhor de Deus finalmente veio. Conforme escreve o apóstolo Pedro, o Cordeiro que, embora conhecido em outro tempo, ainda antes da fundação do mundo, se manifestou diante dos homens no tempo determinado por Deus. Pedro ainda completo dizendo que isto aconteceu “por amor de vós” (1 Pedro 1:20).

O apóstolo João fala desse momento dizendo que “No princípio, era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o era Deus […] e o Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do Unigênito do Pai” (João 1:1,14). Isso explica a declaração do apóstolo Paulo ao dizer que Cristo “é a imagem do Deus invisível”, e que “n’Ele habita corporalmente toda a plenitude da divindade” (Colossenses 1:15; 2:9).

Então definitivamente na história da redenção o melhor de Deus não está por vir, mas já veio: Cristo Jesus. Os crentes do Antigo Testamento podiam dizer: “O melhor de Deus está por vir”; e de fato eles foram salvos pela fé no Cristo que haveria de vir. Mas agora nós somos salvos pela fé no Cristo que já veio.

Perceba quão privilegiados nós somos em poder dizer: “O melhor de Deus já veio”, em vez de dizer: “O melhor de Deus está por vir”. A promessa se cumpriu! O Verbo encarnou, habitou entre nós, viveu as nossas dores, tomou sobre si os nossos pecados, recebeu a ira divina, morreu em nosso lugar e ressuscitou dos mortos nos dando também a vida eterna. Então não faz qualquer sentido dizer que o melhor de Deus está por vir.

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Escatologicamente o melhor de Deus está por vir?

Algumas pessoas sugerem que do ponto de vista escatológico o melhor de Deus ainda está por vir. Isso porque será somente na consumação dos séculos que os crentes experimentarão as bênçãos da salvação em toda sua plenitude; quando viverão para todo sempre ao lado de Deus.

De fato a Bíblia diz que a nossa vida na bem-aventurança eterna, completamente livres da presença do pecado e desfrutando da mais íntima comunhão com Deus, será infinitamente melhor do que a vida presente aqui na terra (1 Coríntios 13:10-12; 2 Coríntios 3:18; 1 João 3:2).

Mas a questão é que não podemos dissociar o que está por vir, do que já veio. É impossível separar as bênçãos futuras que se darão com a segunda vinda de Cristo, com aquilo que Cristo conquistou para nós em sua primeira vinda e que já experimentamos aqui e agora. As bênçãos escatológicas não são bênçãos diferentes, mas são as mesmas bênçãos da salvação cumpridas em toda sua potencialidade.

Então se um dia desfrutaremos das bênçãos da salvação em toda sua plenitude, isso só será possível porque Cristo estabeleceu a paz pelo seu sangue derramado na cruz. Por meio de Cristo Deus reconciliou consigo todas as coisas, tanto na terra como no céu (Colossenses 1:20).

Sobre isso, o apóstolo Pedro ainda escreve: “Por meio dele vocês creem em Deus, que o ressuscitou dentre os mortos e o glorificou, de modo que a fé e a esperança de vocês estão em Deus” (1 Pedro 1:21).

O melhor de Deus está por vir em nossas questões pessoais?

Por fim, sobre a possibilidade de dizer que o melhor de Deus está por vir para se referir ao socorro de Deus nas tempestades de nossas vidas, é reduzir demais a ideia do que é o melhor de Deus. O rei Davi entendeu muito bem isso quando escreveu: “A tua graça é melhor que a vida” (Salmo 63:3). Então nada que tenha a ver com a nossa existência neste mundo é comparável com a graça de Deus manifestada em Cristo.

Além disso, muitas vezes Deus nos trata, nos aperfeiçoa e nos restaura através do sofrimento. Isso, no entanto, não significa que a provação é o pior de Deus para nós, e que o livramento da prova é o melhor de Deus que está por vir.

Isso fica mais do que claro quando lemos que o espinho na carne de Paulo – que era algo que lhe causava dor e sofrimento – era na verdade uma benção de Deus para sua vida que o protegia e o fazia se lembrar da suficiência da graça (2 Coríntios 12:7-10). Portanto, dizer hoje que o melhor de Deus está por vir é uma declaração difícil de justificar à luz da Palavra de Deus.

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