Tamar, filha de Davi, foi uma princesa de Israel nos tempos bíblicos. Ela era filha de Maacá, filha de Talmai, rei de Gesur, e irmã de Absalão. Tamar foi a única filha do rei Davi mencionada nominalmente na Bíblia, mas sua história foi marcada pela vergonha e desolação.
Tamar cresceu num lar complexo, caracterizado tanto pelo brilho de uma corte em expansão quanto pelas fraturas internas produzidas pela poligamia real. O texto bíblico registra que Davi teve pelo menos oito esposas principais — entre elas Maacá, a mãe de Tamar e Absalão. Além dessas esposas, Davi também mantinha algumas concubinas. Com tudo isso, o relacionamento familiar na casa de Davi era conturbado, com seus filhos competindo pela herança real.
Amnom foi o primogênito de Davi com Ainoã de Jezreel e, portanto, seu herdeiro real natural. O segundo filho de Davi se chamava Quileabe, fruto de seu relacionamento com Abigail, mas ele não recebeu nenhuma projeção no relato bíblico. Em seguida, Davi foi pai de Absalão, Adonias e outros filhos listados na Bíblia.
Além disso, Davi ainda se envolveu no terrível episódio de adultério com Bate-Seba e na morte de Urias. O quanto esse seu comportamento absolutamente reprovável influenciou seus filhos, não sabemos. Mas é totalmente possível que ao presenciarem seu próprio pai aparentemente se safando de um adultério seguido de um assassinato encomendado, eles tenham pensado que também poderiam fazer o que bem entendessem. Contudo, sabemos que Davi não escapou das consequências de seu pecado. Como foi profetizado pelo profeta Natã, a espada jamais se apartaria de sua casa, e o que aconteceu na história de Tamar foi um desdobramento desse juízo.
Seja como for, após o seu pecado com Bate-Seba e Urias, Davi parece ter perdido parte de sua perspicácia e o controle disciplinar de seus filhos. No relato sobre Tamar, nitidamente Davi não percebeu que seu amado filho primogênito estava tramando contra sua própria meia-irmã.
O plano de Jonadabe e Amnom contra Tamar, filha de Davi
Tamar é apresentada no texto bíblico como “formosa” e “virgem”, vestida com a túnica talar que distinguia as filhas solteiras do rei. O texto registra que Amnom, filho primogênito de Davi, a amou com tal intensidade que se angustiou a ponto de adoecer, pois não via meio legítimo de possuí-la. O que se disfarçava de paixão era, na realidade, lascívia incubada num coração habituado a privilégios de corte.
De acordo com o autor bíblico, Amnom tinha como amigo muito próximo seu primo Jonadabe, um homem descrito como astuto ou sagaz. Jonadabe era alguém que sabia arquitetar meios para obter o que queria. Ele percebeu a perda de peso do príncipe e tramou uma estratégia. Ele aconselhou Amnom a fingir-se doente, solicitar a visita de Tamar e pedir que ela lhe preparasse bolos especiais à vista dele, para então ficar a sós com a irmã.
Jonadabe contava com a complacência de Davi, que costumava visitar pessoalmente os filhos enfermos e ceder a seus caprichos. Assim, a trama não só levaria Tamar até o quarto de Amnom, mas também envolveria o pai em responsabilidade indireta.
Amnom não respeitou Tamar, filha de Davi
Amnom seguiu o plano de Jonadabe e conseguiu fazer com que Davi enviasse Tamar à sua casa. Inocentemente, a jovem tomou a massa e fez os bolos para Amnom. Quando tudo esteve pronto, Amnom dispensou os servos com o pretexto de não ter forças para comer diante de outras pessoas. Em seguida, ele apoderou-se de Tamar, num ato de violência contra ela.
Ainda assim, Tamar tentou conversar com Amnom. Primeiro, a princesa apelou à lei e à consciência nacional. Ela pediu que seu irmão não a forçasse, pois não se fazia tal loucura em Israel. Depois, Tamar ponderou o futuro de ambos, questionando para onde ela levaria a sua vergonha diante daquele horror moral, e tentou convencer Amnom de que ele seria considerado um dos loucos em Israel.
Por fim, talvez numa tentativa desesperada de ganhar tempo ao perceber que nenhum argumento dissuadia seu meio-irmão de sua obsessão, Tamar sugeriu que ele pedisse sua mão a Davi, ainda que soubesse do impedimento legal.
Infelizmente nada comoveu Amnom. O texto registra que ele violentou Tamar. E como se isso por si só já não fosse algo terrível e degradante, após conseguir o que queria, o perturbado príncipe herdeiro mandou que Tamar se levantasse imediatamente e fosse embora, tratando-a como uma coisa que devia ser descartada. O que o primogênito de Davi dizia ser amor, era na verdade, uma obsessão violenta que no final se revelou em ódio.
A desolação de Tamar, filha de Davi
Tamar, filha de Davi, foi completamente desonrada. Então, ela rasgou seu vestido real, colocou cinzas sobre sua cabeça e saiu gritando, num gesto que demonstrava grande lamento e indignação. Nesse contexto Tamar se encontrou com Absalão, que percebeu de pronto o que havia sucedido.
A primeira atitude de Absalão foi perguntar se Tamar havia estado com Amnom. Essa pergunta revelava que a obsessão de Amnom já não era segredo na corte de Israel. Em seguida, Absalão aconselhou a irmã a ficar em silêncio, prometendo justiça futura. Completamente desolada, Tamar foi acolhida na casa de Absalão.
Quando soube do ocorrido, o texto bíblico registra que Davi se enfureceu, mas nada fez contra o filho primogênito. Sua ira foi impotente. O rei, talvez lembrado de seus próprios pecados, ficou moralmente paralisado. À semelhança do sacerdote Eli, o juiz que não refreou seus filhos, Davi perdeu o controle disciplinar sobre a própria casa.
A vingança de Absalão em favor de Tamar, filha de Davi
Enquanto o pai se omitiu, Absalão não falou com Amnom nem mal nem bem, mas alimentou ódio em silêncio. O texto bíblico registra que ele esperou dois anos inteiros até a tosquia dos seus rebanhos em Baal-Hazor, ocasião festiva na qual convidou todos os príncipes de Israel.
Davi, reticente, acabou permitindo que Amnom representasse a família real. Durante o banquete, Absalão garantiu que Amnom ficasse embriagado, e depois ordenou que seus servos o matassem. Diante da morte de Amnom, os demais príncipes fugiram apressadamente montados em suas mulas.
O desespero foi tão grande, que mensageiros confusos informaram a Davi que todos os filhos do rei tinham sido mortos, mas Jonadabe corrigiu a notícia dizendo que apenas Amnom havia perecido, conforme a vingança que Absalão vinha arquitetando desde o dia em que Tamar foi violada.
Depois da morte de Amnom, Absalão fugiu para Gesur, ficando refugiado no reino governado por Talmai, seu avô materno. O texto registra que Davi pranteou todos os dias o filho morto, mas ao mesmo tempo desejava ver Absalão, ainda que não mandasse chamá-lo. A espada profetizada por Natã cravava-se mais fundo, pois o rei, culpado de omissão, via-se incapaz de aplicar justiça sem admitir a própria falência moral.
Desdobramentos da história de Tamar, filha de Davi
Três anos depois, Joabe percebeu que a nostalgia do rei minava a administração do reino, e tratou de convencer Davi a permitir que Absalão voltasse a Jerusalém. Mesmo estando em Jerusalém, durante dois anos Absalão não pôde ver Davi. Contudo, Absalão cultivou sua imagem e influência em Israel, se apresentando como alguém que prezava pela justiça.
Algum tempo depois, Absalão viajou a Hebrom com o pretexto de pagar voto e, ali, se proclamou rei. Davi relutou em enfrentar o próprio filho, e fugiu de Jerusalém com seus sermos leais, enquanto outros homens muito influentes e grande parte de Judá aderiam ao usurpador.
A violação de Tamar, portanto, gerou não só a morte do herdeiro natural de Davi, mas o primeiro cisma político de sua dinastia. Absalão demonstrou a todo o Israel sua posição de poder, humilhando completamente a casa de seu pai. Ele, inclusive, tomou as mulheres de Davi diante de todo o povo.
Mas na sequência da história, a improvisada tropa de Davi, comandada por Joabe, desbaratou o exército de Absalão. O príncipe, cavalgando em sua mula real, ficou suspenso pelos cabelos num carvalho espesso e foi transpassado por dardos, apesar da ordem explícita de Davi para tratar seu filho com brandura. Mais uma vez o juízo anunciado por Natã havia se cumprido.
Um mensageiro trouxe as notícias da vitória a Davi, mas ao saber do fim trágico de Absalão, o rei transformou triunfo em lamento. Joabe precisou advertir o rei de que sua tristeza desmoralizaria os sobreviventes e destruiria o que restava da autoridade real. Apenas então Davi sentou-se à porta para receber o povo. Entretanto, o retorno triunfal foi tardio e houve instabilidade entre as tribos israelitas. A vergonha de Tamar havia irrompido em fratura nacional. O pecado doméstico não apenas quebrou a família de Davi, mas quase arruinou toda a nação.
Qual foi o fim de Tamar, filha de Davi?
O texto não menciona Tamar depois dessa história, mas sua condição de mulher desolada permaneceu como ferida aberta na corte. Em suma, Tamar foi violentada; Amnom e Absalão foram assassinados; Davi, envergonhado; e Israel quase dividido.
Assim, Tamar foi não apenas vítima de um crime hediondo; ela se tornou o epicentro de uma crise que desestabilizou a dinastia davídica e revelou a profundidade do pecado humano. A vergonha que a princesa carregou no corpo ecoou na vergonha política de Israel.
A triste história de Tamar, filha de Davi, aponta para o princípio da doutrina da depravação total evidenciada no fato de que mesmo o “homem segundo o coração de Deus” não apenas foi um pecador, mas também transmitiu às gerações seguintes impulsos desordenados que a lei não conseguiu conter. Isso não significa que toda pessoa é tão má quanto poderia ser, mas que nenhuma dimensão da vida, inclusive a ordem familiar, permanece isenta da inclinação ao mal.
Nesse ponto, a história de Tamar, filha de Davi, traz importantes alertas. A exemplo Davi, pais, pastores e líderes devem saber que onde há duplicidade moral, as novas gerações aprendem a banalizar o pecado.
A exemplo de Amnom, aqueles que hoje são tentados por sua lascívia devem saber que o salário do pecado é a morte. A exemplo de Absalão, aqueles que buscam vingança por conta própria precisam entender que este é um caminho de ruína.
A exemplo de Jonadabe, não se pode tolerar conselheiros astutos que facilitam o pecado, pois isso pode destruir famílias, dividir comunidades e derrubar reinos. Por fim, a exemplo de Tamar, todos aqueles que sofrem a dor da violência e a vergonha da injustiça devem saber que o Juiz de toda Terra não deixa nada impune.
Além disso, a história de Tamar prefigurava a necessidade de um sucessor de Davi que pudesse exercer um reinado de perfeita retidão, uma expectativa cumprida apenas na pessoa e obra de Jesus Cristo.