Quem Eram os Queneus na Bíblia?
Os queneus eram uma tribo nômade ou seminômade que habitava a região do Sinai e do Sul de Canaã. A etimologia do nome “queneus” remonta às raízes aramaicas e árabes da palavra gyn, associada ao metal e ao trabalho metalúrgico. Por isto, normalmente os queneus são identificados na história antiga como ferreiros ou aqueles que trabalhavam com metais.
Este significado do termo “queneus” encontra paralelos no Antigo Testamento, especificamente na figura de Tubalcaim, filho de Lameque da linhagem de Caim, descrito como “mestre de toda obra de cobre e de ferro” em Gênesis 4:22. Isto, no entanto, não significa que os queneus fossem descendentes de Caim, mas que eles ficaram conhecidos por possuírem habilidades e um estilo de vida que foram desenvolvidos por alguns representantes da família de Caim.
Como os queneus viviam?
A metalurgia exercida pelos queneus era uma habilidade muito apreciada na Antiguidade. Mas além da metalurgia, os queneus também se dedicavam ao pastoreio e viviam em tendas, evidenciando um estilo de vida nômade adaptado às condições do deserto. Inclusive, as habilidades dos queneus como ferreiros estão alinhadas à presença de ricos depósitos de minério de cobre de alta qualidade encontrados na região em que esse povo habitava, como o Sinai e o Wadi Arabá.
Mas parece que os queneus não se organizavam num grupo uniforme. Ao invés disso, alguns estudiosos acreditam que provavelmente os queneus formavam diferentes clãs que tiveram uma raiz ancestral comum e habitavam a mesma região.
Além disso, evidências arqueológicas, como o mural de Beni Hassan no Egito, datado do século 19 a.C., ilustram a vida nômade dos Queneus, destacando suas habilidades em diversas áreas, desde a metalurgia até a música e a pecuária. Este mural apresenta homens semitas, acompanhados de suas famílias, transportando diversos itens, incluindo foles, o que indica a prática da metalurgia durante suas migrações.
Os queneus na história bíblica
As narrativas do Antigo Testamento oferecem detalhes adicionais sobre os queneus. O texto bíblico menciona a ligação entre os queneus e outros povos no Sinai, como os midianitas, e reforça o registro de que eles estiveram presentes em áreas ricas em minerais, como o Neguebe e a região de Arabá.
Além de localizar geograficamente os queneus, essas passagens bíblicas também apontam para a provável diversidade que havia dentro desse grupo. O sogro de Moisés, por exemplo, é identificado tanto como queneu quanto como midianita, evidenciando as integrações tribais dos povos nômades naquele tempo. Eles firmavam alianças entre si e residiam em várias comunidades. Porém, alguns estudiosos argumentam que a conexão entre queneus e midianitas se restringia apenas à localização, e não exatamente à identidade tribal.
A terra dos queneus foi prometida por Deus aos descentes de Abraão em Gênesis 15:19. Na sequência da história bíblica, houve momentos de cooperação entre representantes desse povo e os filhos de Israel, como durante o Êxodo. O próprio casamento de Moisés com Zípora, filha de Jetro, um queneu, e a subsequente oferta de Hobabe, possivelmente cunhado de Moisés, para guiar os israelitas pelo deserto, indicam a integração e o impacto significativo dos queneus na trajetória dos israelitas naquele período. O sogro queneu de Moisés não apenas o acolheu em Midiã, mas depois também ofereceu conselhos valiosos para a liderança dos israelitas no deserto.
Durante os períodos dos juízes e da monarquia em Israel, os queneus continuaram a manter uma presença significativa na região, especialmente com os descendentes dos parentes de Moisés integrando-se às comunidades israelitas. A presença dos queneus entre os homens de Judá e sua menção nas genealogias bíblicas, atestam sua influência duradoura e seu lugar na história de Israel (cf. Juízes 1:16). Nesse contexto, a Bíblia fala de alguns queneus que descendiam do fundador do grupo dos recabitas, e que formaram clãs de escribas em Jabez (1 Crônicas 2:55).
Quando Saul fez guerra contra os amalequitas, os queneus foram poupados. O rei de Israel avisou para que os queneus saíssem do meio dos amalequitas para não serem destruídos com eles (1 Samuel 15:6). Mais tarde, Davi usou seus despojos para presentear as cidades dos queneus que estavam no território de Judá (1 Samuel 30:26,29).
Os queneus foram os primeiros adoradores de Jeová?
Ao longo do tempo, muitos estudiosos já debateram a influência dos queneus em seu convívio com os israelitas. Nesse sentido, surgiu o que ficou conhecida como a “Hipótese Quenita”, que aborda especialmente à origem do conhecimento de Moisés sobre Deus e a prática de habilidades artesanais específicas.
Basicamente a Hipótese Quenita se baseia na premissa de que a habilidade de Moisés e Arão na fusão e fundição de metais, como demonstrado na criação do bezerro de ouro e da serpente de bronze, pode ter sido adquirida através da associação de Moisés com os queneus, visto que esta habilidade metalúrgica, essencial para a confecção desses objetos, era um traço característico desse povo.
Até este ponto a argumentação pode fazer sentido, pois não é implausível que Moisés, tendo vivido entre os queneus, tenha aprendido e absorvido suas habilidades e técnicas, incluindo a arte da metalurgia.
Mas a Hipótese Quenita se mostra falha quando propõe que Moisés aprendeu o nome de Deus, Yahweh, através de seu sogro queneu. Inclusive, esta teoria sugere que o documento mais antigo do Pentateuco seria a fonte “K” ou “Queneu”. Desta forma, a hipótese defende que Jeová era originalmente a divindade tribal dos queneus, e que Jetro, o sogro de Moisés, era o principal sacerdote desse culto. Então, supostamente Moisés teria aprendido essa religião no clã do seu sogro e utilizado para moldar uma nova crença entre os israelitas.
No entanto, não há nenhuma evidência bíblica ou histórica que sirva para fundamentar as alegações dessa teoria de que os queneus foram os adoradores originais de Yahweh. Ao contrário disso, o texto bíblico indica claramente que Yahweh já era conhecido pelos patriarcas muito antes do encontro de Moisés com os queneus. Além do mais, Êxodo 18.12 não deixa qualquer dúvida de que o queneu Jetro foi levado à fé no Deus de Israel através do testemunho de Moisés, e não o contrário. Isso sugere que Jetro, como representante dos queneus, estava aprendendo sobre Jeová através de Moisés, e não ensinando a Moisés sobre Ele.
Por tudo isto, a Hipótese Quenita tem sido amplamente rejeitada pelos eruditos do Antigo Testamento. O que de fato há de confiável sobre os queneus se resume apenas ao fato de que eles eram tribos nômades que dominavam habilidades de metalurgia, e que interagiram de forma significativa com os israelitas no contexto do Antigo Testamento.